Pesquisar este blog

13 de abr. de 2008

O mistério de nós mesmos.

Voando, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 15/03/2005
Voando foi criado em 15-03-2005


Guerreiros falam do conhecimento como um pássaro mágico e misterioso que interrompeu seu vôo por um momento, de modo a dar ao homem esperança e propósito; que eles vivem sob a asa desse pássaro, ao qual chamam pássaro da sabedoria, pássaro da liberdade; que o nutrem com sua dedicação e impecabilidade. Sabem que o vôo do pássaro da liberdade é sempre em linha reta. Uma vez que não há maneira de fazer uma volta, não há maneira de fazer um círculo e retornar; e o pássaro da liberdade pode fazer apenas duas coisas: levar os guerreiros consigo, ou deixá-los para trás. (nagual Elias - O poder do Silêncio - Carlos Castañeda)


Era uma vez, duas vezes, três - sei lá quantas! -, uma pessoa comum, por isso mesmo totalmente incomum. Era igual a todo mundo, e como você sabe ninguém é igual a ninguém. E, como qualquer outro, teve muitos sonhos quando criança, que diminuiram quando adolescente, que diminuiram muito quando jovem, que diminuiram mais ainda quando adulto..., o que sempre foi bastante comum entre a maioria das pessoas que ele conhecia, portanto, não era tão estranho assim que, agora, já nem sonhasse mais.

Era bastante atento à vida. Gostava de viver vendo a vida passar. E, como a maioria, 'Estava à toa na vida e o 'seu' amor o chamou pra ver a vida passar… e ele foi ver. E viu sua vida ir sumindo lá no finalzinho da rua. Até deu um tchauzinho pra ela, pois, afinal de contas, ele era um sujeito educado, apesar de nunca ter se preocupado muito com cultura, como quase todos que conhecia. Esquentar a cabeça pra que? Isso é coisa de intelectual. Deixe que outros pensem por você. Dá menos trabalho. Não é assim que os colegas falavam na escola? Mas ele estudou. Não muito, como a maioria. Chegou até ao nível médio. Mediano como a maioria. E a sua vida foi assim, mediana.

Lia um pouco e tirava algum proveito do que lia. Sempre podia falar mais e ser mais respeitado pelo que sabia. Não se aventurava muito em compreender tudo o que lia, afinal de contas quem o fazia?

Mas ele era um trabalhador. Não fazia exatamente o que sonhara durante a sua vida, mas quem consegue ser o que quis? A maioria das pessoas que conhecia não havia conseguido. Por que logo ele teria de conseguir? Estava sobrevivendo, e até bem em relação a muita gente. Não passava fome, tinha o que vestir. Até ia assistir aos filmes que a galera falava que era bom. Jogava bola, e era até bom-de-bola, em relação à maioria dos colegas. Não seria nunca um profissional ou o craque mais falado do time, mas também não seria o último a ser escolhido na hora de dividir times para uma pelada de rua.

Gostava de música. Ah! música é música. Ouvia tudo o que as pessoas ouviam. Conhecia a maioria dos hits de sucesso que tocava nas rádios populares. Até cantava! Não seria um cantor profissional, as dava pra cantar com o grupo, que ele e os colegas criaram. Não era um grupo assim de primeira, mas não era ruim também. Estava mais para a média.

Teve momentos de impacto em sua vida. E ainda consegue se lembrar deles. Fez artes, pintou o sete, fez escândalos nos acampamentos, fumou um cigarro e bebeu um gole de vinho escondido, experimentou sexo... Mas o que tinha demais? Todo mundo não fazia isso? Ninguém podia dizer que ele era anormal. Isso não! Havia cometido alguns erros, alguns enganos. Mas erros todo mundo também comete: Herrar é Umano!

Já tinha traçado os planos para a sua vida: só construir uma casa e casar, ter filhos, ter netos, quem sabe?, fazer uma viagem de turismo, com hotel e tudo, ter um ''carro, comida e alguns 'miões' por mês'', porque todo mundo precisa ter algum conforto, né?

E esperar a morte, por que a morte todo mundo um dia vai ter que encarar.

A vida agora estava toda certinha, dentro dos padrões. Ninguém podia negar: era verdade. Mas bateu uma sensação de que lhe faltava algo, ou que algo lhe escapava das mãos, e não conseguiu identificar o quê. E, por alguns momentos, tentou descobrir o que era. Mas depois deixou pra lá. Afinal de contas, como todos diziam, isso era coisa pra pessoas que não tinham nada a fazer na vida.

Um dia, por um acaso, que não é comum na vida, leu que ser mediano, médio ou medíocre era a mesma coisa. E aquele era o impulso que precisava na vida. E desejou transformar-se. E, dia após dia, procurou dar sentido a cada coisa que fazia. E isso o distinguiu entre todos os seus iguais. O tornou senhor de si, de suas práticas e de seus pensamentos. Já não lhe bastava viver: a vida era pequena demais para se viver e ele precisava de Vida que não se esgota, por mais que a vivamos, que traz a cada dia não a mesma rotina, mas um mundo novo de possibilidades para serem analizadas, escolhidas e realizadas. Uma vida onde o brilho dos sonhos era o mesmo que se expressava em cada olhar, em cada gesto, em cada atitude interior, em cada fala. É claro que isso não o tornou muito popular, mas, em compensação, o tornou mais feliz, mais inteiro, mais verdadeiro consigo mesmo. E a vida tornou-se para ele uma história sem fim...

Somente um sino e um pássaro quebram a quietude...
Parece que os dois conversam com o sol poente.
Silêncio colorido de ouro, a tarde é feita de cristais.

Uma pureza agita as árvores frescas, e
além de tudo isso
um rio transparente sonha que correndo sobre pérolas
se liberta e flui para o infinito.
(Juan Ramón Jimenez)

Wellington de Oliveira Teixeira em 21 de novembro de 1995.

Nenhum comentário: