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25 de fev. de 2009

Teimosia

Teimosia, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 25 de fevereiro de 2009
Teimosia, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 25/02/2009


— Depois de uma resposta tão maneirosa, aconselha-me minha filosofia a calar e não perguntar mais nada; tanto mais que em certos casos, como sugere o provérbio, só se permanece filósofo — calando-se.
(Nietzsche - Humano, demasiado humano.)

Quando alguém insiste numa determinada direção, mesmo quando a maré parece ser contrária, nos acostumados a chamar esse alguém de teimoso.
Não parece óbvio que quem vai contra os ventos não alcançará o seu objetivo?

Esse é um senso comum que sempre vai não ao encontro mas de encontro aos nossos desejos, principalmente quando eles exigem da força de vontade.

Normalmente, esse senso comum é dirigido só para gente comum e, assim, para aqueles que não se sujeitam ao mandamento do ir somente à favor da maré, seguir a maioria, pegar caminhos já trilhados (e talvez, por isso, mais fáceis) é destinada a teimosia como arma por que há ocasiões em que não dá para desistir de tentar, de buscar, de seguir para um alvo, de ir em busca de sonhos e de criar seus próprios caminhos a partir de pequenas trilhas construídas com braços, pernas ou com o corpo inteiro.

Contraditoriamente, admiramos e damos honrarias àqueles que vencem a vontade de ficar com as facilidades e querem o ultrapassamento dos limites, dos obstáculos, dos desafios. Os troféus são destinados àqueles que vencendo seus próprios corpos conseguem vencer as marcas de outras pessoas e querem ser os desafiantes de si mesmo. Mas essa é uma contradição que facilmente é justificada por todos ao dizer que são seres especiais, capacitados, seres extraordinários os que conseguem, não os meros mortais.

Acalmamos a nossa vontade de ir pro mundo e de descobertas para não corrermos riscos. Sempre é perigoso ir sozinho. A velocidade é perigosa, as alturas e as profundidades são assustadoras. A expressão de si causa um medo terrível.

Somos adestrados diariamente para não acreditarmos em nosso potencial e também a não saber mensurá-lo corretamente. Há aqueles que se julgam imortais e sem elaborar uma estratégia para obter a vitória sobre os seus desafios, se lançam num mundo desconhecido e potencialmente mortal ignorando as possibilidades de minimizar as forças da adversidade. A esses à teimosia deve ser acrescentada outra adjetivação: burrice.

Lembro-me de uma expressão que ouvi várias vezes ser dirigida tanto a mim quanto a outros: teimoso como um jumento. E para ser sincero, como nunca vi um jumento empacar, fico só com a imaginação da cena: alguém tentando puxar, empurrar, tirar o animal de algum lugar e ele se negar a dar um passo a mais.

Outros, porém, se utilizam de todos os recursos disponíveis e seguem aos mais altos pontos da terra, ao mais profundo dos mares, deslizam por montanhas de gelo, dão saltos e vivenciam a experiência da novidade e da superação. Também são parte destes outros aqueles que ousam expressar a sua verdade na arte e o fazem com fotos, pinturas, esculturas bem como os que cantam, dançam e usam todo tipo de material e tecnologia disponíveis para alcançar efeitos cada vez mais intensos.

São esses teimosos os que delimitam novos territórios e alargam os limites e que fazem o mundo mais amplo para si e para os outros. E são realmente dignos de mérito pelos seus feitos.

Em alguns momentos, porém, fico pensando que teimosos são aqueles que se deixaram paralisar e que não aceitam os desafios da vida, os que ficam se lamentando pela dureza da vida, os que somente se permitem fazer julgamentos de acordo com os padrões definidos e jamais conseguirão perceber a genialidade daqueles que - mesmo com tudo contrário - ousaram tentar. Se não conseguiram alcançar o objetivo, fizeram algo grandioso: abriram o caminho para, qualquer um que desejar, avançar.

Sem poder concluir, só descubro que a teimosia tem mais de uma face. Como todos nós.


Wellington de Oliveira Teixeira, 25 de fevereiro de 2009.

* Uma pergunta que qualquer artista pode fazer é: Por que eu teimo em produzir?

12 de fev. de 2009

Quando um segundo tempo chega

 Tayane Abs Gonçalves, anime dreams 2008-SP Fotógrafo desconhecido Tayane Abs Gonçalves, anime dreams -sp 2008

"Será que é assim que termina, pensei, será que tudo o que um Mestre diz não passa de um amontoado de palavras bonitas que não o podem salvar do primeiro ataque de um cão raivoso?"
(Richard Bach - Ilusões. As aventuras de um Messias Indeciso)

Eu conheci um jovem que sonhava ter um lar, ser um pai-amigo-professor, ter pequenas conquistas na vida desde que pudesse ter paz e sossêgo, possuir conhecimento que modificasse a sua e a vida de outros, ter a sua cara-metade para compartilhar tudo o que conseguisse e para se entregar por inteiro.

E o conheci de uma maneira inusitada, como tudo de bom na vida, um quase desconhecido o trouxe a mim e nos apresentou.

Logo de cara a pura oposição nele se mostrou: a estatura ocultava a grandeza do ser humano guardada em sua alma; a sua vivacidade se perdia em gestos contidos e tímidos; sua generosidade em partilhar escondia o imenso vazio que se criara pela necessidade de receber um olhar, um toque, um afeto genuínos; a firmeza dos seus gestos encobria a suavidade da sua entrega de si e do abrir mão do que lhe pertencia, por direito; o desprendimento em relação ao modo e ao que vestia camuflavam a força de sua presença e tudo o que apresentava apenas calava a bondade e superioridade do simples cuidar para que todos pudessem estar juntos e em prol da felicidade dos outros.

Abnegação não era ainda a palavra que o descrevia. Ele tinha apenas 13 anos e o que mais chamava a atenção era o seu olhar profundo e aquela tristeza que o acompanhou como amiga inseparável a vida toda. Em muitos momentos ela o tomou para si e o levou para um mundo exclusivo e impenetrável de onde, mesmo quem mais o amou, nunca pode retirá-lo.

A fascinação pelas conquistas o tornou um caçador de aventuras, desbravador de matas e buscador de trilhas para lugares onde o silêncio falava mais alto.

A sua entrega total o fez presa fácil da mágoa e do sofrimento - poucos são capazes de alcançar um patamar tão alto seja em coleguismo, amizade ou amor. Mas, como tudo no mundo, o aprendizado se fez presente e lhe conferiu honra ao mérito: onde todos desistiam, ele se entregava mais e mais.

Seus medos foram fantasmas sempre assíduos nessas horas, pois negar-se é o mesmo que abrir as defesas de si mesmo. E por conta disso, em muitos momentos tristeza foi sinônimo de depressão, de solidão, de incompreensão.

Eu sei por que eu vi, por que vivi junto tendo a impotência como companheira, já que ninguém pode viver a vida de outro e, mesmo que eu tenha as respostas para a pergunta dele, tenho como desafio conquistar as minhas próprias.

Indolência também foi marca registrada nesse jovem quase homem: tão fácil resolver as questões, por que se esforçar, por que antecipar os problemas, por que investir na previsão? Então, que tudo se resolva apenas quando não houver mais oportunidade de postergar.

Perdulário? Talvez. Mas jamais deixar de oferecer o melhor para os que estavam ao seu redor e principalmente sob sua proteção. Por conta disso, em várias ocasiões ficou em situação financeira complicada. Então, mais ainda se entregou a trabalhos extras para suprir tudo e mais um pouco. Mesmo que pessoalmente discorde desse procedimento, nele reconheço uma grande carga de afeto.

A sua sede de compreensão o levou a trilhar diversos caminhos entre filosofia, esoterismo e religiosidade. Leu muito, mas apenas o que lhe interessou. Conversou muito mais - esse era um caminho que mais lhe agradava - e questionou tudo e a todos. Colocou em cheque os parâmetros que o balizavam, por que eram de outros, para obter algo que fosse seu pedaço de fé, seu terreno de entendimento e sua proposta para a vida.

Agrediu alguns nesse processo, é claro. Autoridades se sentiram rejeitadas; parentes, incompreendidos; companheiros, solitários; amores, mal-amados. Fez parte de sua jornada pequenas agressões verbais, em momentos intempestivos, principalmente quando era o momento de dar novos passos, subir o degrau da plenitude. O quanto lhe doeu esse processo de desprendimento não sei dizer.

Foi conquistando os espaços desejados ao mesmo tempo em que abria mão de outras expectativas que tinha para si. E quando de si surgiram partes de si, mas, em si próprias, um outro, aprendeu o sentido da palavra abnegação enquanto o abrir mão de si por si mesmo. E o fez como não encontrei ninguém ainda capaz de fazê-lo.

E rio comigo mesmo ao pensar no herói que eu acabei de criar. E (des)rio, se é que posso criar essa palavra, por que é isso mesmo que eu acredito que ele seja por méritos próprios e não pelas palavras que posso me valer para descrevê-lo.

Um herói é aquele que ultrapassa a média e vai abrindo os caminhos com suas conquistas, mas, como todo mundo, carrega seus desafios e dores. Esse não difere.

Hoje, com família estabelecido, enfrenta o maior desafio de um grande homem: passar o bastão para os filhos, que reivindicam seu lugar no mundo sem sustentação, proteção, sobreposição de idéias por meio de autoridade formal. E, é claro, a sua liberdade para ir e vir sem justificativas, permissões ou esclarecimentos. Isso faz tão parte da vida que, mesmo repetindo-se há milhões de anos, nunca estamos preparados para enfrentar. Até mesmo nos convencemos de que o que acontece é por falta de amor, falta de respeito, falta de algo que nos faz falta e não sabemos bem o que é, mas que parece com o tornar-se desnecessário. Como pode ser desnecessário o abrir mão de si que sempre foi a sua marca registrada? No oculto da sua tristeza, aquele mundo onde ninguém o alcança, a sua dor se manifesta e acaba por expandir-se de tal modo que, mesmo inconscientemente, ataca os que ama.

Palavras geram mundo - isso ele aprendeu de guri. Mas, agora, ignora e agride. Diz o que não quer dizer, diz mau dito: maldito.

Supõe não ser mais quem era e não percebe que não é mesmo e ninguém é. E iguala-se ao menino(a) que o enfrenta - fazendo apenas o que a vida exige de cada um, isto é, o tornar-se alguém, individualizar-se, separar-se dos cordões umbilicais e tornar-se ser pensante para construir seu próprio arcabouço de conhecimento e vida. Numa expressão simples; buscar a sua plenitude.

Olhos de fora. É isso o que é necessário: uma outra visão, ângulos diferentes da mesma percepção. Não para delimitar o que deve ser feito, não! Ângulos auxiliares que nos alertem para outros possíveis que não entraram em nosso campo de visão. Todo o cotidiano nos embaça a visão quando nos faz acreditar na rotina e na repetição e não na transformação. Não vemos que o menino(a) cresceu e quer usar o que aprendeu.
_ "Você me ensinou assim, porque não posso aplicar na minha vida, agora?"
_ "Você é hipócrita!"
_ "Você é fraco!"

Será que foi isso que você achou daqueles que possuíam autoridade sobre você, quando foi o seu momento, nesta vida?

Mas esse homem feito não é igual a maioria. Certamente ele não pertence à mediocridade. É preciso respeitar o desafio de cada um: e esse é o dele. Quão difícil deve estar sendo essa nova tarefa hercúlea que a vida apresentou!

Só que ao mesmo tempo em que penso nisso, me lembro que a gente atrai o necessário sempre. Somos nós que buscamos os desafios pelo prazer e pelo aprendizado (shimoda e fernão capelo, lembra-se?), por isso devemos ampliar o nosso horizonte mais uma vez: somos seres ilimitados.

E, como estou distante, à distância me valho dos instrumentos possíveis para dar esse recado de um amigo para o seu melhor amigo: a superação sempre fez parte de sua trajetória e não será diferente dessa vez. Os caminhos não exitem em si, você é o caçador que faz as trilhas para alcançar o seu alvo. Construa, então, as pontes necessárias - se necessário use vigas de puro amor para serem indestrutíveis quando o ataque for mordaz, e agredir (só não se esqueça que nós é que permitimos que nos agridam) - e faça o fluxo ultrapassar as barreiras e os precipícios e alcançar o seu alvo.

Talvez seja esse o seu último grande e necessário ato para com esses que você amou, antes mesmo de nascerem - assim como eu. Por isso, dê o melhor de si. Acorde aquelas forças que repousaram por um tempo e manifeste o brilho deste ser que sempre foi alvo de minha admiração e amor.

Busquei nesse texto apenas recordá-lo de quem você é, porque é somente isso que é necessário.
Cai na PAz, meu amigo.


Wellington de Oliveira Teixeira, em 12 de fevereiro de 2009.



* Tayane (e Tiago) Abs Gonçalves são meus afilhados, filhos de Valcir Gonçalves e Djane Abs Gonçalves.