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12 de nov. de 2017

Reformulações inesperadas

Reformulações inesperadas, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 12-11-2017.
Reformulações inesperadas, criado em 12-11-2017.

O que podemos fazer a respeito de tudo isso? Não é fácil para você fazer alguma coisa, pois tem apenas dez anos de idade. Mas você pode tentar o seguinte. A próxima vez que alguém lhe disser algo que soe importante, pense consigo mesma: “Será que esse é o tipo de coisa que as pessoas provavelmente sabem porque há evidências? Ou será que é o tipo de coisa em que as pessoas só acreditam por causa da tradição, da autoridade ou da revelação?”. E, quando alguém lhe disser que uma coisa é verdade, por que não dizer a ela: “Que tipo de evidência há para isso?”. E se ela não puder lhe dar uma boa resposta, espero que você pense com muito cuidado antes de acreditar numa só palavra.
Com amor,
de seu pai
(Richard Dawkins — O Capelão do Diago, p.726)
Por situar-se muito além do senso comum, a afetação é um fenômeno a ser investigado. O que denominamos contato (inclusive o físico) está na categoria de um dos mais difíceis elementos da vida a ser destrinchado porque — por incrível que pareça! — ele não ocorre no mundo que a física atual desvendou: detecta-se a proximidade e algo da ordem da interferência, o que ainda não está esclarecido totalmente.

Somos semelhantes a esferas de energia com um campo de força gravitacional que, se receptivo, remodela-se e registra 'ondas' emitidas por alguma fonte ('interna' ou 'externa' é apenas um modo de expressar os atravessamentos). Em que pese ser majoritariamente inconsciente, esta permeabilidade consentida aos impulsos é o que estabelece qualquer tipo de comunicação: em escala genética, passando pelos impulsos que perpassam os neurônios aos efeitos em escala macrodinâmica *.

A sensibilidade é o resultado da interação e, portanto, totalmente relacionada à maleabilidade dessa 'superfície etérea', também de ordem desconhecida. No mundo da físico-química, quanto mais enrijecido é o 'tecido' menores são as probabilidades de trocas, de absorção das diferenciações e de aprendizados (o novo, sua apreensão e seus efeitos no ser). Por isso, a permeabilidade se configura como a única possibilidade de se expor cuidadosamente ao permitir, inicialmente, apenas os fluxos administráveis e, aos poucos, expandir esse processo: as células nos ensinam isso.

Na seletividade e adaptabilidade que configuram a Ordem da vida, não há lugar para seres que não se transformam. Tornam-se excrecências que se autoeliminam por não se difundir, se propagar ou reproduzir-se: evite comparações com 'castigo' por permanecer estático: a vontade potente de vida se enfraqueceu nesse elemento específico – ocorre também nas degenerescências onde a capacidade de renovar-se reduz-se incontornavelmente. Ao fim, todo elemento é absorvido pelo sistema e se reconfigura em uma outra forma.

Antes de qualquer conclusão precipitada, é preciso entender que qualquer contexto que se supõe duradouro permite acontecimentos-surpresa: uma forma de ser inadaptada a determinado contexto pode se tornar a única a resistir diante de uma reformulação inesperada do meio – catástrofes, dentre elas. Por isso, não há espaço para quaisquer predeterminismos ou moralização da natureza. As verdades se estabelecem exclusivamente nos 'encontros' e seus efeitos, e somente os capazes de surfar nessa onda caótica se preservarão e se propagarão – e isso vale para ideias e costumes, também.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 12 de novembro de 2017.

* Li, por esses dias, a carta de um cientista para sua filha de 10 anos de idade. Reproduzo um dos trechos mais interessantes, que se complementam com a citação inicial desse artigo:
É uma pena, mas não é possível evitar que, visto que as crianças necessitam ser sugadoras de informação tradicional, elas acabem acreditando em tudo aquilo que os adultos lhes dizem, seja verdadeiro ou falso, seja correto ou errado. Muito do que os adultos dizem a elas é verdadeiro e baseado em evidências, ou é ao menos algo que faz sentido. Mas, se uma parcela do que É uma pena, mas não é possível evitar que, visto que as crianças necessitam ser sugadoras de informação tradicional, elas acabem acreditando em tudo aquilo que os adultos lhes dizem, seja verdadeiro ou falso, seja correto ou errado. Muito do que os adultos dizem a elas é verdadeiro e baseado em evidências, ou é ao menos algo que faz sentido. Mas, se uma parcela do que eles dizem é falsa, tola ou mesmo nociva, não há nada que as impeça de acreditar nisso igualmente. Ora, quando as crianças crescem, o que elas fazem? Bem, como seria de esperar, elas dizem as mesmas coisas à geração de crianças seguinte. Assim, uma vez que algo se transforme numa forte crença — mesmo que se trate de algo completamente falso e que, desde o início, nunca tenha havido razões para se acreditar nisso —, pode perdurar para sempre.
Será que foi isso o que aconteceu com as religiões? A crença de que há um deus ou deuses, a crença no paraíso, a crença de que Maria nunca morreu, a crença de que Jesus nunca teve um pai humano, a crença de que as preces são respondidas, a crença de que o vinho se transforma em sangue — nenhuma dessas crenças é sustentada por nenhum tipo de evidência satisfatória. E, no entanto, milhões de pessoas acreditam nelas. Talvez seja porque se disse a essas pessoas que deveriam acreditar nessas coisas quando elas ainda eram tão jovens que acreditavam em qualquer coisa.
Milhões de pessoas acreditam em coisas inteiramente diferentes, porque outras coisas foram ditas a elas quando eram crianças. Coisas distintas são ditas às crianças muçulmanas e às crianças cristãs, e nos dois casos elas crescem absolutamente convencidas de que estão certas e de que as outras estão erradas. Mesmo entre os cristãos, os católicos romanos acreditam em coisas diferentes do que se acredita entre os presbiterianos ou entre os episcopais, entre os shakers ou os quakers, entre os mórmons ou os holly rollers **, e todos se mostram absolutamente convencidos de que estão certos e de que os outros estão errados. Eles acreditam em coisas diferentes, exatamente pelo mesmo tipo de razão pela qual você fala inglês e Ann-Kathrin fala alemão. Ambas as línguas são, em seu próprio país, a língua correta. Mas não pode ser verdade que religiões diferentes estejam certas em seus próprios países, pois as diferentes religiões afirmam que coisas opostas são verdade. Maria não pode estar viva na Irlanda católica ao mesmo tempo que está morta na Irlanda do Norte protestante.
estão errados. Eles acreditam em coisas diferentes, exatamente pelo mesmo tipo de razão pela qual você fala inglês e Ann-Kathrin fala alemão. Ambas as línguas são, em seu próprio país, a língua correta. Mas não pode ser verdade que religiões diferentes estejam certas em seus próprios países, pois as diferentes religiões afirmam que coisas opostas são verdade. Maria não pode estar viva na Irlanda católica ao mesmo tempo que está morta na Irlanda do Norte protestante.
** Denominação depreciativa que faz referência às várias denominações religiosas em que o fervor espiritual é expresso por meio de gritos e de violentos movimentos corporais.

5 de nov. de 2017

Impactos meteóricos

Impactos meteóricos, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 05-11-2017.
Impactos meteóricos, criado em 05-11-2017.

Pensamos que talvez essa "arte" seja uma chave para o entendimento de sua tecnologia. Nossa curiosidade com respeito à "arte" desse povo provocou uma reflexão sobre uma série de pontos significativos:
  1. O desenvolvimento da civilização teve uma aceleração por volta de 5 mil anos atrás quando a escrita antes apareceu na Suméria;
  2. O Povo da Cerâmica Canelada possuía a mesma capacidade mental que nós temos atualmente;
  3. A chave para o nosso rápido e moderno progresso científico é a habilidade de registrar, acessar e usar informações;
  4. Somente uma pequena parte das pessoas no mundo compreende realmente a ciência que faz nossa sociedade funcionar, e essa elite frequentemente usa o conhecimento para controlar as pessoas que não o possuam.
(Robert Lomas e Christopher Knight — A máquina de Uriel: as antigas origens da ciência, p.389 )
O temor provocado pelas forças naturais, em especial, aquelas de grande impacto na superfície da terra, produziu na humanidade uma marca de reverência. Esse nível de referência, para os cientistas atuais, é a origem das mitologias e religiosidades: 'os céus e a terra manifestando o poder dos deuses'. As consequências dessa marca precisam ser estudadas e compreendidas: há um nível de beleza nela que ultrapassa o seu mal uso.

Sensibilidades humanas, como a intuição e a espiritualidade, ainda em primórdios de estudos acadêmicos, permitirão esclarecimentos capazes de ultrapassar os charlatanismos e seu uso para controle social – registrado na história, em diversas épocas, a casta sacerdotal utilizou conhecimento científico, de acesso restrito, para manter o povo em 'cabrestos curtos'. O registro do movimento dos planetas (eclipses eram alguns dentre os meios para comprovar seu poder) foi algo que permitia tal influência.

A antropologia e outras ciências são reunidas em A máquina de Uriel: as antigas origens da ciência * (Robert Lomas e Christopher Knight) para fornecerem fortes indícios de que vários conjuntos de pedras ordenadas – estruturas megalíticas, como Stonehenge – eram observatórios astronômicos sofisticados que permitiam gerar calendários solares, lunares e planetários exatos, a medição do diâmetro da Terra e provavelmente a predição da colisão, na terra, de um meteorito, em 3150 a.C..

Os autores defendem que muito antes do que se ensina nas escolas, já havia uma civilização altamente avançada, dedicada a preparar-se para impactos meteóricos futuros, permitindo a reconstrução da civilização em um mundo destruído.

Sem ignorar polêmicas que surgem (identifico interferências fortes de uma determinada visão produzida pela maçonaria – organização da qual fazem parte os autores), as reflexões apresentadas no livro também promovem um novo nível de pensamento a respeito da formação da hegemonia da religiosidade judaico-cristã via destruição de todo o registro dos conhecimentos celta e dos druidas (rotulados como 'bruxaria' e 'demoníacos') pela casta sacerdotal-cristã.

Aprecio as propostas, avaliações e comprovações apresentadas que resgatam um pensamento muitíssimo anterior ao datado oficialmente. Difiro, aqui, da visão de que há qualquer aproximação possível entre ciência verdadeira e as religiões. A ciência é isso: não ter medo de se aventurar, escavar, escrutinar e repensar e, a seguir, constituir lógicas capazes de subsistir a quaisquer questionamentos racionais, sempre fugindo aos predeterminismos.

Se isso significa encarar aqueles que, de dentro dela, distorcem a sua vocação essencial, tudo bem: cada nova teoria, que se comprovar mais potente que a anterior, será a adotada. Doa a quem doer, as verdades científicas não são um monolítico e, sim, um processo e uma construção constante, pronto a agregar aquilo que ultrapassa o escrutínio rigoroso do que há de opinião ou tradição, em cada teoria.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 05 de novembro de 2017.

* Apesar de, em alguns momentos, a linguagem acadêmica tornar-se um obstáculo, indico a leitura do livro para quem já tem o segundo grau. Para os demais, indico uma iniciação ou noção sobre o tema do livro encontrada no vídeo Resenha - A Máquina de Uriel

3 de nov. de 2017

Aprisionamentos e fugas

 criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 03-11-2017.
Fugas, criado em 03-11-2017.

Retornemos à nossa lista dos sintomas que as pessoas atingidas pelo vírus mental da fé, e sua gangue de infecções secundárias, podem experimentar.
4. O paciente pode surpreender a si mesmo comportando-se de maneira intolerante em relação aos vetores das fés rivais, ou até mesmo, em casos extremos, matando-os ou advogando a sua morte. Ele pode se mostrar igualmente violento em sua disposição em relação aos apóstatas (pessoas que um dia abraçaram essa fé mas depois renunciaram a ela) e aos hereges (pessoas que desposam uma versão diferente da fé — com freqüência, o que talvez seja significativo, uma versão apenas ligeiramente diferente). Ele também pode se sentir hostil em relação a outros modos de pensamento que são potencialmente inimigos de sua fé, tais como o método do pensamento científico, que poderia funcionar como uma espécie de software antiviral.
(Richard Dawkins — O Capelão do Diabo, cap.3: A mente infectada, p.417 )
Humanidade e razão começaram o seu flerte há pouquíssimo tempo e os gestos ou movimentos de encontro ainda são muito tímidos. Mesmo que algumas das formas de construção de pensamentos se mostrem eficientes e potentes para expressar o aprendizado individual e coletivo, a escolha ainda recai para o assujeitamento aos discursos escravizadores*.

A ignorância, os sentimentos confusos e o medo (em seu estado primário diante das forças da natureza) são a matéria prima da constituição dos deuses. Seus porta-vozes apelam para discursos que os usam para capturar almas e ter indivíduos ou populações como serviçais voluntários. Desde os primórdios da humanidade, mitologias escravizaram corações e mentes.

Dito dessa forma, mesmo que cautelosamente, a reação coletiva é de rejeição: admitir a escravidão e buscar a libertação é algo para pouquíssimos – negação e acomodação tornaram-se amigas íntimas da parcela imensa da humanidade sem acesso ao conhecimento. As cavernas continuam sendo o lar daqueles que se algemaram ou se deixaram algemar por frases de efeito que promovem o terror perante a possibilidade do ciúme, da vingança ou do castigo de uma entidade qualquer. Submetidos a uma avaliação crítica, bastam segundos, na maioria das vezes, para esses discursos caírem por terra: mas frases repetidas incessantemente foram adotadas como 'verdades'.

Essa reflexão rejeita a submissão voluntária, aponta a sabedoria e a ciência como instrumentos de avaliação crítica e promotora da renovação humana e, em especial, as fragilidades promovidas a partir da opção pela ignorância ao invés do conhecimento.

Meu objetivo não é desqualificar ou destituir o poder da intuição, das sensibilidades espirituais e da fé: acredito que são capacidades que os seres humanos possuem de se integrar a um todo e compor as forças da vida. Mas o faço em relação aos que se usam delas para cooptarem incautos e, assim, manter seu status social e financeiro.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 03 de novembro de 2017.

* Nas palavras, bem humoradas mas ferinas, de Dawkins:
Descrever as religiões como vírus da mente é algo entendido às vezes como um sinal de desdém ou mesmo de hostilidade. As duas coisas são verdade. Frequentemente me perguntam por que me oponho tanto à 'religião organizada'. Minha primeira resposta é que também não sou exatamente simpático à religião desorganizada. Como um amante da verdade, suspeito das crenças firmemente defendidas que não encontram sustentação em nenhum tipo de evidência: fadas, unicórnios, lobisomens e todo outro elemento do conjunto infinito de crenças possíveis e irrefutáveis de que fala Bertrand Russell com sua imagem de um hipotético bule de porcelana chinesa girando em torno do Sol (ver “A grande convergência”, p. 258).
A razão pela qual a religião organizada merece franca hostilidade é que, diferentemente da crença no bule de Russell, ela é poderosa, influente, isenta de impostos e, além disso, sistematicamente transmitida a crianças que não têm idade suficiente para se defender.a Não forçamos as crianças a passar seus anos de formação memorizando livros lunáticos a respeito de bules. As escolas subsidiadas pelo governo não excluem as crianças cujos pais dão preferência a outros formatos de bule. Aqueles que acreditam no bule não apedrejam os ateus, os apóstatas, os hereges e os blasfemos em relação ao bule, até levá-los à morte. As mães não obrigam seus filhos a desistirem de se casar com shiksasb [Termo pejorativo que designa as mulheres não judias] cujos pais acreditam em três bules em vez de em um único bule. As pessoas que servem o leite primeiro não dão tiros no joelho daqueles que servem primeiro o chá. (Idem, p.344)

29 de out. de 2017

Sustentável, renovável e includente

Sustentável, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 28-10-2017.
Sustentável *, criado em 28-10-2017.

A esquizoanálise tem um único objetivo, que
a máquina revolucionária, a máquina artística, a máquina analítica
se tornem peças e engrenagens umas das outras.

(Deleuze — Conversações)


O corpo, a alma e o universo se estruturam em uma intricada trama, como a teia de uma aranha. Bastam pequenas falhas para promover a perda do equilíbrio e paralisia parcial ou global, em qualquer dos sistemas, levando ao colapso da estrutura maior. Ou exatamente o oposto: a geração de um novo equilíbrio.

Nem percebemos, mas é necessária uma imensa rede para permitir qualquer tipo de movimento a um corpo – sentar-se, ficar ereto e de pé ou deitar-se. Um eixo central necessita efetuar troca fidedigna de informações, numa comunicação em frações de segundos, com todo os outros elementos participantes.

Um sistema precisa atuar autonomamente e, simultaneamente, integrado completamente aos outros: sistemas que cuidam da energia e de sua distribuição, das informações externas e internas e das decisões decorrentes delas, visando sobrevivência, reprodução e satisfação de um corpo.

Há uma infinidade de sistemas galáticos que se sustentam pelo equilíbrio entre as forças integradoras de suas estrelas; as órbitas são efetivadas com precisão e, no processo, a manutenção, absorção e o surgimento de novos astros estruturam o Ser Universal.

O mundo psíquico é habitado por uma espécie de usina que produz desejo e exige a sua satisfação: sentidos captam e geram um mapeamento do mundo e este se torna a nossa percepção, o nosso referencial de existência – definem o que é necessário e, mais do que estimulam, determinam a sua obtenção. Fluxos de desejos, integrados em um nível superior no corpo humano, o impulsionam a estar vivo.

Somos seres movidos por desejos e, sem eles, não há sustentação da vida, não há constituição de sociedade, não há preservação como espécie, nem a produção do novo. Seres humanos aprenderam a conter sua bestialidade em prol da vida comunitária, só que, mesmo habitando o calabouço da alma, ela está lá, aguardando a brecha para se expressar. Há fluxo de desejo que, quando reconhecido, precisa ser contingenciado a determinados contextos; outros, contidos; mas é preciso dar espaço para os impulsos criativos e reordenadores.

Eu fundo a minha defesa da inclusão social aqui: cada elemento, mesmo os considerados de funções inferiores, são essenciais para a precisão dos sistemas. A sustentabilidade é o equilíbrio não apenas associado ao corpo individual e suas necessidades particulares, mas expande-se às de um conjunto de seres — a rede social, ou planetária, como no universo. Exclusões promovem desequilíbrios que, uma hora ou outra, irão decompor e desestruturar a rede de sustentação e preservação.

A renovação é outro ponto a ser esclarecido: é improdutivo apoiar-se em fundamentalismos. A defesa da reprodução do que já existe geralmente é embasada no seu valor passado. Não leva em consideração a caducidade e decrepitude contínua de um sistema. Os equilíbrios são dinâmicos, baseados na substituição dos elementos antigos e gastos por novos. O enrijecimento gera problemas em nível sistêmico. A história comprova a fatalidade de impedir o novo, com inúmeros fatos de momentos e locais diferentes. Como diz um ditado: errar é humano, a repetição do erro (pode ser por desinformação, mas quando não o é, não tenho medo de afirmar) é burrice.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 28 de outubro de 2017.

* Insistir em vias que se tornaram inócuas não produz efetividade. Sua substituição, criteriosa, é fundamental. Todo e qualquer sistema só se mantém a partir de sua renovação constante. No processo, se perde algo, mas o que ocupa o seu lugar tem potência para fazer valer a sua presença. O medo da mudança e da transformação é o que gera os piores inimigos da vida, de acordo com a história humana.

22 de out. de 2017

Filhos da Revolução

Filhos da Revolução, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 21-10-2017.
Filhos da Revolução, criado em 21-10-2017.

Quando nascemos fomos programados a receber o que vocês nos empurraram com os enlatados dos U.S.A., de nove às seis: desde pequenos nós comemos lixo comercial e industrial.
Mas, agora, chegou nossa vez: vamos cuspir, de volta, o lixo em cima de vocês!
Somos os filhos da revolução, somos burgueses sem religião, somos o futuro da nação: Geração coca-cola.
Depois de 20 anos na escola não é difícil aprender todas as manhas do seu jogo sujo – não é assim que tem que ser!
Vamos fazer nosso dever de casa e aí, então, vocês vão ver suas crianças derrubando reis, fazer comédia no cinema com as suas leis.
Somos os filhos da revolução, somos burgueses sem religião, somos o futuro da nação: Geração coca-cola.

(Legião Urbana — Geração coca-cola*)

Estou idoso (para além da metade aceitável dos anos de vida que ainda me permitem a expressividade plena) e meu olhar ousa escapar das verdades que foram estabelecidas para esse momento histórico. Prefiro uma percepção de eternidade – um olhar que não se deixa capturar pelas imposições instantâneas e temporais e ousa usar tudo disponível como propulsor visando um novo entendimento. Sou irascível, sim! (me irrito com facilidade diante de fundamentalismos e extremismos). À impressão que eu tenho, sou odiado por muitos, amados por poucos e para ninguém ocupo a posição de alguém que abriu mão de ser verdadeiro: quando disputam ou brigam comigo, eu sinto o seu cuidado em primeira mão.

Liberdade, Beleza, Verdade e Amor, os ideais dos Filhos da Revolução, Paris em 1900. Eles chocaram os valores padrões de sua época, no mundo todo. O que àquela época e atualmente se esquece, a extravagância dos jovens e sua chama deve ficar intocada pelos poderosos abraços da estabilidade e das convenções sociais que move o mundo. Replicada em tantos momentos da história, a sua força genuína promoveu o cerne dessa espetacular fonte de transformação social: a ruptura para efetuar a evolução (só de vez em quando, retrocesso!).

É preciso não desvalorizar os discursos e suas lógicas, razões e provocações íntimas que constituíram a representação do pensamento estabelecido por uma geração. Como a da atual. Mas, por favor, entenda que, em todas, os avanços também foram frutos da ruptura com os valores anteriores.

Exageros à parte (concordo com o Cazuza: jovens são exagerados – e tenho uma certa saudade disso!), com todos os possíveis erros e retornos indesejados (o conhecimento histórico não é o forte de qualquer nova geração!), eles investem a alma naquilo que acreditam (e é fundamental não dizer 'para o bem e para o mal', aqui.).

Constantemente preciso me recordar desse fogo que abrasou a minha alma para não cair em tentação de desacreditar da juventude: o tentar (errar e acertar), o tempo e o espaço pertencem a eles, não a nós os idosos (menos ainda aos que se permitiram ser velhos, qualquer que seja a sua idade.).

Virar a página sempre será necessário, do contrário todas as emoções que nos aguardam se tornarão frases repetitivas sem conteúdo: que o mundo deles seja exatamente o que seu investimento (pensamento, seu suor e sua luta) conseguir obter, não mais! Não importa o quanto esse meu sentimento – pleno de amor – lhes deseje um mundo perfeito. Faço uma pausa de declarar: 'Essa é a grande utopia: sonhar com um mundo melhor para as gerações que nos seguem! (estou sentindo, mas do que pensando, nos sobrinhos(-netos) e netos, afilhados e, em especial, nos encontros de alma – aqueles que se estruturaram por um duplo-coração desejando.]'.

Escrevo em um computador cujo núcleo (somente neste instante) poderia ser considerado de 'última geração', com uma tela que reflete o máximo possível de pixels, e com isso, detalhes de cores e profundidade. Aprecio profundamente o que o novo traz à vida, sem abrir mão da crítica ao que isso provoca ao (meio) ambiente. São eles, xs meninxs de hoje, xs capazes de rejeitar os refugos como aceitáveis, são elxs que exigirão a sustentabilidade da vida (corpo, alma e espírito), que nós arduamente lutamos para que se tornasse a pauta de qualquer investimento.

Eu amo a meninada. Isso eu me permito todos os dias: conviver com os possíveis seres pensantes que radicalizarão a verdade e não os discursos fundamentalistas que visam a desagregação humana. Me integro e me entrego de corpo e alma em prol da vida igualitária, dos processos de aceitação independente de diferenciação. Em qualquer nível!

Eu sou fruto de uma geração que questionou o estabelecimento de um padrão de individualidade e instituiu em seu lugar a subjetividade: só é possível dizer que há vida ser se houver, durante cada fase de estar, espaço para que o interior se expresse exteriormente – com ou sem críticas. Meus predecessores optaram por correr o risco de aceitar o risco de aflorar práticas doentias à escolher ocultá-las – e, com isso, avaliá-las e, quando necessário, curá-las (ou demonstrar que foi essencial liberá-las!).

Continuo lutando (dói mais agora que antes): eu me recuso aceitar a fragilidade (mesmo que a natural), prefiro a cabeça erguida. Fui precedido por exemplos valorosos que estão incrustados em minha alma e no meu corpo. Mas, meu compromisso não é com eles, do mesmo modo que o deles não foi apenas comigo – o mundo precisa de transformadores e vale ousar ceder a energia que me move em prol deles. Vai dar certo? Claro que não: o mundo nunca será perfeito!

De tão difícil entendimento, o avanço é o que mantém a vida; a diferenciação é a única porta para a transformação. Vejo entristecido os que, todos os dias, ouvem e reproduzem aquele discurso de que 'se não fizer diferente, o resultado vai ser o mesmo' e, por incrível que pareça!, em sua maioria, imploram pela escravidão da repetição e não pela liberdade. Ser idoso tem algo de bom: eu posso, ao olhar para o passado, dizer: 'nada mudou!'.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 22 de outubro de 2017.

* Ainda hoje, não se compreende esse genial sarcasmo do escritor e músico Renato Russo: os filhos dos ricos cheiravam Cocaína e os dos pobres cheiravam a Cola de sapateiro, e formavam a nova geração, modelada pelos 'enlatados' – programas de TV americanos, que são reproduzidos no país desde a época da Ditadura Militar.
Em sua visão, a arte (a música e o cinema, em especial) seria o veículo da crítica aos padrões estabelecidos (e corrompidos).

19 de out. de 2017

Despersonalização induzida

Despersonalização induzida, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 17-10-2017.
Despersonalização induzida, criado em 17-10-2017.

Fundamentalismo:
Qualquer grupo religioso ou movimento étnico que acredita nos seus dogmas como verdade absoluta, indiscutível e objetiva voltar ao que são considerados princípios fundamentais, ou vigentes na fundação do determinado grupo.
Extremismo:
Quando o fundamentalismo ultrapassa as fronteiras de seu próprio grupo e inclui impor aos outros suas crenças; descarta o diálogo social atuando, inclusive violentamente, para determinar seu pensamento e sua fé como únicos.

Cessar a predação em prol da cooperação é o objetivo básico da adoção das ideias societárias onde a proteção se estabelece para todos em seu interior. Mas a civilização não é algo definível como universal se avaliarmos os diversos modos de agrupamentos humanos existentes e os produzidos intencionalmente na atualidade.

As imposições por dominação retiram dos seres humanos o mínimo necessário a sua integridade física. Sociedades regidas com despersonalização, empobrecimento, desnutrição e sob armamentos não se incluem no ideal (nem sequer o tangenciam) civilizatório. É preciso identificarmos os controles sociais como um poderoso armamento: os fundamentalismos extremistas e as ditaduras se estabelecem por seu intermédio.

O contrassenso se manifesta no fato de que sociedades avançadas em civilização promovem a descivilização, fomentando colocar seres humanos à margem do mínimo necessário para obtenção de lucros. O apoio (inclusive militar) às ditaduras facilita a extração dos bens nacionais, a utilização de pessoas como cobaias de experimentos laboratoriais, apenas para citar algumas das práticas que se incluem numa imensa lista para a manutenção de seus interesses.

Por fim, um paradigma tanto tortuoso quanto vil estabelece que há vidas que valem mais (e outras que não). Quanto vale 30 mortos nos EUA ou na Europa e quanto valem as vidas da Somália é algo determinado pelo Mercado, o único juiz absoluto da atualidade. Se é vendável, há produção de comoção, do contrário, usa-se o viés do encobrimento, da ocultação do fato nas manchetes dos poderosos meios de comunicação (leia-se, manipulação!) que atravessam a nossa civilização capenga.

Se o objetivo era a proteção da prática predatória, mas esta se estabelece em mentes e coração num outro nível (uma vida se torna descartável se não produz mais riquezas!), a imposição do mais poderoso é a barbárie institucionalizada.

Ou reacendemos em níveis mais fortes as ideias democratizadoras, as práticas de questionamentos e de críticas embasadas, ou, muito em breve, esse encabrestamento do pensamento e das liberdades individuais extremista irá produzir consequências deletérias para todos ao nosso redor. E iremos encarar, sofrendo, nossos jovens e adolescentes expostos, incautos, acreditando em sua imortalidade, sendo abduzidos, encarcerados e abusados* – simplesmente porque alguém poderoso desejou usar as facilidades que o poder absoluto e ditatorial permite.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 19 de outubro de 2017.

* khaled Hosseini é originário de Cabul, no Afeganistão, doutorado em medicina. Suas memórias de um Afeganistão pré-invasão soviética, o colapso do regime Talibã e suas experiências pessoais o levaram a escrever o seu primeiro romance O caçador de Pipas, 101 vezes na lista semanal de dos mais lidos do mundo e número um em quatro delas. O filme aborda o poder destrutivo das crenças religiosas quando são levadas ao extremo do fanatismo. Importantíssimo para se entender (de forma menos traumática) a que leva o calar-se diante dos fundamentalismos extremistas.

14 de out. de 2017

Singular e Diferenciado

Emanações, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 12-10-2017.
Emanações, criado em 12-10-2017.

E no instante está o é dele mesmo. Quero captar o meu é. E canto aleluia para o ar assim como faz o pássaro. E meu canto é de ninguém. Mas não há paixão sofrida em dor e amor a que não se siga uma aleluia.
Meu tema é o instante? meu tema de vida. Procuro estar a par dele, divido-me milhares de vezes em tantas vezes quanto os instantes que decorrem, fragmentária que sou e precários os momentos — só me comprometo com vida que nasça com o tempo e com ele cresça: só no tempo há espaço para mim.
(Clarice Lispector — Água Viva, p.7)

Usa-se a palavra singular para um caso único e plural para vários. O universo gosta da singularidade. Não é necessário apelar ou usar de conceitos complicados para demonstrar que a única constante no universo é a diferenciação. Tudo nele é exclusivo e único: todos os seres são seus filhos 'unigênitos', para se usar um termo bíblico conhecido.

Haverá falhas em cada tentativa de se generalizar ou criar regras gerais porque, por maiores semelhanças que haja entre indivíduos de uma determinada espécie, estes nunca serão iguais.

Só vai adiante a diferença que permite se adaptar às transformações permanentes e, muitas das vezes, radicais em seu ambiente. Nem sempre se pode contar com a ideia de evolução – o caso quando dá certo uma determinada diferenciação –, na maioria das vezes, ocorre a regressão ou extinção.

O universo não perdoa, nem é gracioso nesse sentido. Sua graça e beleza está na forma igualitária com que dispõe os recursos. Qualquer um de seus elementos têm um campo de possibilidades literalmente infinito para se apropriar durante a sua duração ou tempo de vida.

Pode haver mais, Porém, duas estratégias são comuns (opostas, mas uma não exclui a outra): cooperação ou domínio-submissão. Em qualquer um, a sobrevivência (ou permanência) está na capacidade de composição, de fazer encontros para absorver ou trocar os elementos particularmente necessários.

Notadamente, os agrupamentos se constituíram como refúgio para escapar das dificuldades coletivas existentes. As variações individuais, como meio para melhor adaptação. Nos contextos menos radicais, avança quem combina as duas e, nos demais, aquele cuja diferença permite um encaixe melhor no quebra-cabeça que se formou.

Num universo onde não há Leis imutáveis, a única constante é a diversidade e quando essa determinação é quebrada o cronômetro da extinção se inicia. Isso porque a regressão também é uma forma de ir adiante: a fixidez e o imobilismo torna algo anacrônico, obsoleto, sem uso adequado *.

Se opor ao que é cronológico, num universo que exige continuidade e adaptação às novas necessidades, é decretar falência e morte. Não importa quão lento, é preciso mudar e se deslocar do anteriormente estabelecido, do contrário a vida cessa.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 14 de outubro de 2017.
* Em grande medida, pensar cientificamente exige sair do lugar comum, do esperado (agradeço por esse aprendizado aos grandes pensadores – em todos os campos de conhecimento – da história da humanidade!). Mas é possível o esforço para gerar uma linguagem acessível, sem abrir mão do rigor necessário. Clinton Richard Dawkins é um divulgador dese tipo de conhecimento e sugiro a leitura de O capelão do diabo (uma coletânea de escritos). Há seriedade, mesmo nos muitos e controversos ataques a alguns pensadores. Não houvesse, perderia seu valor para mim. Vou em direção diversa da dele, mas suas críticas permitem aperfeiçoar minha lógica e fugir às armadilhas em que muitos caem ao recorrer apenas ao palavrório sem consistência.
Escrevendo com paixão e clareza, Richard Dawkins, um dos mais influentes divulgadores de ciência em atividade, não hesita em se posicionar perante temas polêmicos, sempre em busca da verdade científica:
O único membro da lista que é capaz de regularmente persuadir os neófitos quanto à sua superioridade é a verdade científica. As pessoas são leais a outros sistemas de crença pela simples razão de que foram criadas daquela maneira e nunca chegaram a conhecer uma alternativa melhor. Quando elas têm a sorte de poder escolher, os médicos e outros profissionais do gênero prosperam, ao passo que os feiticeiros entram em declínio. Mesmo aqueles que não têm, ou não podem ter, uma educação científica optam por se beneficiar da tecnologia que a educação científica de outras pessoas tornou disponível. É fato reconhecido que os missionários religiosos converteram um enorme contingente de pessoas em todo o mundo subdesenvolvido. Mas, se eles foram bem-sucedidos, não foi pelos méritos de sua religião, e sim devido à tecnologia de base científica que, compreensivelmente, porém ainda assim de maneira injustificável, trouxe reconhecimento à religião. (p.43)

Para dizer uma vez mais, a ciência não tem meios de responder se um aborto é um assassinato, mas ela pode nos alertar que talvez sejamos incongruentes ao afirmar que o aborto é um assassinato enquanto matar chimpanzés não é. É preciso ser coerente. (p.95)

11 de out. de 2017

Descrédito e Desistência

Impossibilidades, momentâneas criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 10-10-2017.
Impossibilidades momentâneas, criado em 10-10-2017.

Apatia
Estado caracterizado por indiferença, ausência de sentimentos, falta de atividade e de interesse, insensibilidade, indiferença.
falta de energia (física e moral), falta de ânimo; abatimento, indolência, moleza.


Lutar é algo que não se faz com armas e, sim, com a vontade. Seres que a fortalecem possuem capacidade imensa de resiliência perante as impossibilidades momentâneas; são sempre capazes de constituir novas rotas quando a atual se desmorona – e o mais incrível, conseguem usar os destroços como ponto de partida*.

Um dos efeitos mais nefastos que eu conheço na vida é o imobilismo da catatonia depressiva: nada afeta, nada estimula, nada mais ganha valor. Acontece diante da repetição ou persistência dos elementos que enfraquecem as forças do desejo.

Desistência não é algo simples. Avançar é um imperativo da vida, que luta sempre contra os movimentos paralisantes. Porém, há forças políticas e sociais que promovem o descrédito continuamente. Importa a elas que a população fique imóvel, insensível à realidade, adotando a prática de quem já desistiu de tudo: apatia severa onde qualquer coisa serve, a despeito do mal que lhe cause.

Não importam os obstáculos, o nível de energia momentâneo, nem mesmo o grau de ignorância acerca do momento atual, quando a vontade se afirma e o desejo exige expressão. Há infindáveis possíveis querendo se realizar por aí, a despeito do que querem nos tornar e nos fazer acreditar, visando subjugar nossos sonhos.

Além disso, vontade pode e deve ser coletivizada. É possível criar uma rede de interlocução, de troca, de apoio e de transformação. É necessário desconstruir os discursos de 'verdades' absolutas que só enfraquecem o tecido social. Predeterminações e preconceitos são armas para gerar poder para muito poucos. Guerras nunca tem nada de 'santas', são sempre fruto do abuso do poder e da ganância.

Quanto mais vejo a promoção da inércia, fica mais clara a necessidade de me mobilizar para incendiar as vontades, produzir colaboração em todos os níveis. Parodiando o Lulu Santos, 'nós somos muitos, não somos fracos… nós somos um só coração sangrando pelo sonho de viver'**.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 10 de outubro de 2017.

* Historicamente, a produção de falsidades induz ao descrédito, inclusive ao aprisionamento, de personalidades que lutam pelo direito popular: foi assim com Mahatma Gandhi, com Martin Luther King, com Nelson Mandela e tantos outros.
O mais impressionante é verificar que o recurso mais sistematicamente utilizado, atualmente, na internet, por quem tem condições financeiras, é o da compra de 'Curti' e de 'comentários e postagens favoráveis'. Robôs virtuais iludem a população sobre ser boa ou ruim, para a maioria, uma ideia, desconstruindo um dos conceitos mais importantes para a democracia.
Produzir, antecipadamente, a sensação de derrota tem sido a grande estratégia que despotencializa a vontade de luta e impede o melhor do esforço individual e coletivo. Recurso muito utilizado em todos os encontros onde há disputas, o blefe ilude o virtual vencedor e o leva a desistir..
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** Lulu Santos - Tudo Azul.

7 de out. de 2017

Estados e estágios

Estados e Estágios, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 05-10-2017.
Estados e Estágios*, criado em 05-10-2017.

Vento no Litoral

De tarde, quero descansar, chegar até a praia, e ver se o vento ainda está forte.
E vai ser bom subir nas pedras.
Sei que faço isso pra esquecer: eu deixo a onda me acertar e o vento vai levando tudo embora.
Agora está tão longe! Ver a linha do horizonte me distrai.
Dos nossos planos é que tenho mais saudade: quando olhávamos juntos na mesma direção.
Aonde está você, agora, além de aqui dentro de mim?
Agimos certo. Sem querer, foi só o tempo que errou.
Vai ser difícil sem você porque você está comigo o tempo todo.
E, quando vejo o mar, existe algo que diz que 'a vida continua e se entregar é uma bobagem'.
Já que você não está aqui, o que posso fazer é cuidar de mim: quero ser feliz, ao menos.
Lembra que o plano era ficarmos bem?
— Ei, olha só o que eu achei: cavalos-marinhos!
(Legião Urbana)
Vivência é a reunião em um estágio da vida de diversos acontecimentos fortuitos que se conectaram, ao longo do tempo, para promover um determinado estado de percepção da realidade: compreensão e motivação tornando-se a propulsão para cada próxima ação, a cada circunstância.

Há muita incompreensão acerca dos episódios colecionados como etapas de vida – não conseguimos identificar plenamente o que permitiu um acontecimento. Mas eles sinalizam sua passagem com uma marca impressa na superfície da alma. Algo semelhante às estacas com placas indicando o percurso em uma estrada.

Geralmente, só quando a poeira baixa obtemos uma visualização razoável para iniciar uma avaliação sobre seus efeitos. E só após um longo aprendizado entendemos que é possível resgatar tais sinais para uso em novas situações. Não é recordar-se, apenas, é revivenciar a força do momento em que ocorreram.

Essa capacidade humana de observar-se como trajeto ou percurso abre uma possibilidade que é impressionante: a de evitar situações assemelhadas ou de aplicá-las às contextualmente próximas. Há no reino animal habilidades semelhantes, mas o pensamento maximiza essas inferências ou sensibilidades.

O uso fortuito dessa habilidade pode provocar um estado de contemplação intenso, uma rememoração que afeta os sentidos atuais: alegria e paz de espírito ou uma nostalgia (o passado tem seu poder atrativo baseado na ilusão de familiaridade). Dependendo da força disponível no instante, vira fixação, a pura repetição do já vivido que aprisiona.

Não resta dúvidas de que é um aliado, em potencial, para todos que desejam mais liberdade de vida e que desejam se permitir experimentações. Quando uma criança tenta subir na árvore e cai, poderia usar a vivência para paralisá-la, gerar desistência; mas, se ao contrário, avaliar o percurso feito e definir um novo, evitando os percalços, poderá conquistar o desafio. O novo estado de mente foi possibilitado pelo uso consciente dos estágios anteriores, das marcas que deixaram. Talvez sabedoria seja apenas isso: exaustivamente, regatar das vivências seu potencial esclarecedor em novos contextos.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 07 de outubro de 2017.

* A imersão em estados destoantes, aqueles em que seus referenciais diários não atuam, é um poderoso fator de expansão ou retração da potência de vida. Estratégia ou Melancolia podem derivar de mesmas fontes, a depender do modo como são acessadas. O fator que determinará é se a intenção de quem acessa é de avanço ou de retorno.
Com esse entendimento, descrever o atual estado em que você se encontra, pode tornar-se algo terapêutico, pois, no instante em se expõe as questões, um outro entendimento pode emergir. Talvez, até mesmo a empatia e colaboração de quem tem em seu próprio histórico um estágio semelhante.

30 de set. de 2017

Iconoclastia para reapropriar-se

Iconoclastia criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 29-09-2017.
Iconoclastia , criado em 29-09-2017.

E o que significa quando, na versão de outra pessoa, eu sou o vilão? Conheço até bem demais as histórias ruins — mal imaginadas ou mal contadas — porque as escuto muitas vezes dos pacientes. Conheço as manobras dos que põem a culpa nos outros, dos que não conseguem enxergar que eles mesmo, e não os outros, constituem o ponto comum em todos os seus relacionamentos ruins. Existem tiques característicos que revelam a falsidade essencial de tais narrativas.
(Teju Cole — Cidade aberta)

O novo iconoclasta deve ser aquele que se utiliza de rigor de crítica para contrapor crenças estabelecidas ou qualquer tradição que seja invocada por si mesma, apenas. Ele denuncia a hipocrisia social e a aceitação passiva que compactuam com a degradação alheia *. Sabe, com absoluta certeza, que isso vai lhe produzir isolamentos. E quando ocorre, recorre ao entendimento de que é só, em si mesmo, mas que tem a potência de estabelecer conexões e composições com forças de mesma direção e, com isso, estar acompanhado em seus projetos.

Iconoclastia é o processo de desconstrução de ícones, mitos, [in]verdades, subjugo cultural. Mas prefiro adotar a ideia de que também é intentar para refazer a própria imagem no espelho em acordo com o que se é. Narrar a sua história e torná-la própria. Reinventar-se.

A antiga associação com a destruição física não é mais necessária. Ela se efetua com a mudança da mentalidade, do entendimento, com a criação de uma nova percepção não atrelada aos preceitos e preconceitos estabelecidos e entronizados no altar do dito cidadão de bem e guardião da moral e dos bons costumes.

A estratégia para encontrar-se consigo mesmo é encarar suas mazelas pessoais, seus ridículos, suas inconstâncias e incoerências, sem medo: elas existem. Mesmo vencendo estas, outras existirão. Evite retornar às mesmas. Descubra seu modo de desestruturar as forças de dominação que apodrecem a veracidade da sua alma. Conforme for conseguindo, mesmo que parcialmente, busque cuidadosamente identificar e retirar, do que sobra, as capacidades e forças que foram destituídas de suas potências iniciais. Faça um resgate delas.

Entenda isso como abandonar o papel de coadjuvante na vida. O conceito é tão antigo quanto não aplicado, não exercido, ou mesmo ignorado: na linha de produção de verdades intocáveis ocorre o massacre de qualquer semente de renovação. Trazemos histórias, toda a história do universo está dentro de nós, mas nenhuma é única até que alguém abra a sua própria trilha, siga seu caminho e constitua a sua jornada: ouse se reapropriar de si mesmo.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 29 de setembro.

Queria muito que você estivesse aqui

Você se crê capaz de distinguir o paraíso do inferno, céus azuis da dor; distinguir um campo esverdeado de um trilho de aço gelado, um sorriso de uma máscara. Acha mesmo que consegue distinguir?
Fizeram você trocar os seus heróis por fantasmas, as árvores por cinzas quentes, uma briza fresca por um ar quente, mudanças por um conforto indiferente? Você trocou um papel principal em uma cela por um de figurante na guerra?
Eu queria muito, queria muito você aqui. Somos apenas duas almas perdidas, nadando num aquário, ano após ano, correndo sobre o mesmo e velho solo. E o que encontramos? As mesmas e antigas inseguranças.
Queria muito que você estivesse aqui.
(Pink Floyd — Wish you were here, trad. livre)

28 de set. de 2017

Adoro a dúvida

Dúvida, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 28-09-2017.
Dúvida *, criado em 28-09-2017.

A produção de valores precisa de condições favoráveis, do contrário, resulta em seres replicantes. Cópias sociais, como clones genéticos. Há os que louvam essa forma de ser: o Ser tornou impeditivo o ser autêntico.
(Wellington de Oliveira Teixeira — Quando a abstração tornou-se abominável)


Toda certeza é imprescindível e, ao mesmo tempo, instantânea – gera uma ruptura com o entendimento anterior e constitui uma nova compreensão. O problema em se adotar padrões imutáveis é que o imobilismo, a paralisia, a repetição terminam por deteriorar qualquer sistema.

Camuflado nos fundamentalismos, há controle, verdades e subjugo absolutos que beneficiam exclusivamente os seus incitadores. Períodos da história em que isso se verificou, houve mazelas e degradação nos seres humanos. Mas as pessoas o acataram e, como hoje, o admitiram pelo gosto do empoderamento.

Capitães do mato nada mais eram que escravos despersonalizados, que cauterizaram suas almas em função de obter algum poder sobre seus semelhantes: à época do período áureo da escravatura, já existiam sádicos e sociopatas, dentre outros (destaque para os cidadãos de bem, ditos sãos) que incentivaram a situação para dar vazão ao caldeirão de ódios ou desejos inconfessos e reprimidos.

O paralelo com a atualidade é fácil de fazer. Mas, ao se identificar o uso de um novo mecanismo estimulador mental como a midiotização, a situação torna-se muito mais crítica: ódios aflorando, práticas nefastas se estabelecendo, polarização indiscriminada e acrítica, todos os ingredientes necessários para obscurecer a razão. Não à toa, sugere a um observador atento um retorno à Idade das trevas.

A mente controlada esquece que, assim que se estabelecer o jugo, este recairá não apenas naqueles que foram designados como objetos do repúdio. As liberdades de todos ficam incontornavelmente restringidas. E, quando todos estão dominados, o corpo e a alma coletiva padecem, a sociedade adoece. Muitas das vezes, um arrependimento inócuo surge, mas o silenciamento envergonhado em nada altera a realidade, é puro ressentimento.

Só dando voz às dúvidas, permitindo que se efetuem socialmente, um novo processo tem a chance de se iniciar: o de ultrapassamento. É um movimento que afirma que algo que foi considerado essencial e agora se tornou um empecilho para o desenvolvimento — hora de descartá-lo ou substituí-lo, construir e constituir algo diferente.

A dúvida é o motriz da existência plena: não admite estagnação, anseia o próximo desafio e sua superação. Ela se estabelece e, de repente, neste 'foi de um jeito, agora está assim, mas pode mudar e, possivelmente, para melhor' um novo patamar e uma nova verdade surgem. Eu adoro a dúvida! Tem seus perigos (a vida é perigosa, em si), mas qualquer dúvida é melhor que uma certeza enrijecida.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 28 de setembro de 2017.

* A trilogia Retorno à caverna, Primórdios atualizados e Adoro a dúvida (texto e imagens) apresenta uma avaliação crítica ao momento em que vive o Brasil, a partir do Golpe que reuniu Poder financeiro, Legislativo, Executivo e Judiciário (comprovado com áudios e vídeos) sob a batuta do poderio hegemônico na comunicação da Rede Esgoto de TV.
Como item central e essencial à condução processo, a midiotização (a produção de fundamentalismo acrítico) é a maior e melhor arma já utilizada no país para estabelecimento de controle de comportamentos.
Esses textos não pretendem o academicismo, ao contrário, desejam a provocação, a náusea, a indisposição contra a displicente paralisia que se estabeleceu. Um incentivo à iconoclastia em função dos absolutismos e dos preconceitos de qualquer espécie que estabelecem sorrateira ou descaradamente discriminações e exclusões sociais.

24 de set. de 2017

Primórdios atualizados

Primórdios, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 23-09-2017.
Primórdios, criado em 23-09-2017.

O Representante permanente do Brasil nas Nações Unidas também rebateu as acusações de genocídio dos índios da Amazônia: "… houve ausência de malícia especial e da motivação necessárias para caracterizar a ocorrência como genocídio*. Os crimes em questão foram cometidos por razões exclusivamente econômicas, e os perpetradores agiram unicamente para tomar posse das terras de suas vítimas."
(Jared Diamond — O terceiro chipanzé - a evolução e o futuro do ser humano, p.311)


Com a modificação das formas de dominação (de militares para culturais), a assimilação de valores estrageiros foi retirando as características locais, tornando-se o maior e mais poderoso e efetivo poder da atualidade: o subjugo voluntário por parte dos indivíduos.

Quando as cavernas eram o lar, o local de socialização, o referencial mais bem desenvolvido de segurança coletiva, humanos constituíram os primórdios dos agrupamentos sociais. Agentes específicos conservavam e protegiam os bens, enquanto outros obtinham os alimentos. Em busca de melhores condições de vida, caminhava-se continuamente, reservando o período quando a natureza mostrava seu lado mais poderoso e amedrontador para guardar o que já havia sido conquistado e se resguardar.

Na história humana força bruta e gestos protetores e acolhedores produziram questionamentos e modificação contínua nos comportamentos. Em alguns locais foi possível utilizar os conhecimentos adquiridos com o plantio para melhorar a alimentação e a saúde de todos e, neles, a socialização evoluiu. Várias espécies animais foram se achegando, gerando uma nova forma de convívio com aproveitamento mútuo.

O estabelecimento de trocas benéficas para todos permitiu a expansão dessa forma de reunir seres vivos, consolidando alianças entre agrupamentos de diversas localidades. Do surgimento das pequenas aldeias, vilas e cidadelas, encaminhou-se para a formação dos conglomerados, facilitando o desenvolvimento das artes e a transmissão e ampliação do conhecimento prático e teórico: os elementos culturais específicos se definiam e eram transmitidos ao redor.

Na contramão do colaboracionismo, a vontade de apropriação do alheio e uma gama imensa de forças inferiores foram manifestas em intervenções destrutivas. O enfraquecimento dos laços que uniam comunidades distintas, a produção intencional de escassez, a cooptação das vontades políticas de elementos estratégicos: os métodos padrão de atuação para os imperialistas se ampliaram.

Em diversos locais, o uso do poderio bélico-militar foi direto, mas as intervenções por espionagem evidenciaram-se prática mais efetiva: suborno de autoridades públicas e privadas estabeleceu traições, golpes internos e caos instalado, antes da chegada dos usurpadores. No seu rastro, bens locais, a língua e tudo mais que expressava a cultura e os modos de existir e ser de diversos agrupamentos foram extintos ou quase.

Na atualidade, a criação de grupos de manipulação da informação, construídos e mantidos por interesses financeiros, visibiliza essa força de modelação de pensamento. Nessa via de atuação, o lobby e a prática da corrupção constitui a geopolítica ativa e usurpadora dos bens das nações: a entrega dos tesouros estratégicos (extrativismo vegetal, mineral e a principal riqueza atual, a genética da biodiversidade) é aceito passivamente e não questionado.

Ao tempo em que a opinião pública admitiu a servidão como algo aceitável, a depender apenas de em que país, efetivou-se localmente o subjugo sobre a dignidade pessoal (o genocídio indígena e campesino, o uso da mão-de-obra infantil e do trabalho escravo, por exemplo).

Só que algumas questões específicas e locais de resistência ganharam mundo. Denunciados por novos instrumentos disseminados pela internet, a tentativa de aculturação hegemônica teve que remodelar-se. Mas cada técnica aprimorada vai se tornando conhecida e contra medidas são adotadas: a luta por independência vai se tornando objetivo coletivo de muitos povos. Isso confirma que nenhuma força de dominação se exerce sem reações contrárias.

Aos sujeitos que resistem ativamente às apropriações será necessário alavancar conceitos e práticas que se insurjam contra os assujeitamentos, as dominações, os convencimentos da massificação. Desconstruir, em suas bases, os preceitos fundamentalistas e seus poderosos controles de mentes e corpos, via midiotização, é essencial.

Essa perspectiva sinaliza possibilidades de um avanço por vontades, por capacidades, por tudo aquilo que investe na mobilidade ao invés da paralisia. É preciso identificar e investir, de forma coletiva, em aquilo que propiciará mudanças efetivas, que resgatará o uso do que é participativo, colaborativo e minimizador das discrepâncias sociais (especialmente as desigualdades financeiras). Acima de tudo, é preciso repetir incessantemente e fortalecer a ideia de que desistir não está na pauta do dia, muito menos assujeitar-se.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 23-24 de setembro de 2017.

* A fonte utilizada por Diamond para comentar o extermínio dos índios brasileiros foi Victms of the Miracle, de Sheldon Davis, Cambridge University Press, 1977.

21 de set. de 2017

Retorno à caverna

Caverna, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 16-09-2017.
Caverna, criado em 16-09-2017.

Talvez, o futuro nos prepare uma surpresa:
um resgate nessa louca correnteza, qualquer nave que nos leve pelo espaço encontrar os deuses;
Talvez, um herói venha a surgir por entre as cinzas; das ruínas se levante, alcance a gloria,
e na moral da história o mito acabe com a razão.
Mas a verdade está cima do bem e do mal. Nossa lógica furada é a arma mais mortal:
a raiz de todo erro, a medida desse medo de mudar e achar o avesso, nosso fim, nosso começo.
É a nossa visão congelada no tempo esperando as respostas caírem do céu:
acreditar nas lendas do que virá é um álibi perfeito e tudo fica como está.

(Guilherme Arantes — Nosso Fim, Nosso Começo)


De inócuo não há nada nos discursos e ações que, aproveitando questões sociais ainda não elaboradas por grande parte da população, desqualificam a Ciência como um todo em prol de um determinado tipo de visão religiosa. Na mira dos que desferem os ataques, inclusive literais e físicos, as motivações para abortos, os gêneros e os espectros sociais, o ensino crítico e não religioso, e os pensadores de sistemas políticos financeiros não capitalistas e seus defensores.

Antes de prosseguir, um esclarecimento: há pesquisadores das religiosidades renomados em diversos campos científicos, buscando teorias ou comprovações que remetam às possibilidades de um ser inteligente e superior na constituição de grande parte, ou o pleno, do universo – diferindo totalmente da proposta dos fundamentalistas. Aliás, se posicionando contrariamente a estes.

No Brasil, há diversos líderes religiosos midiáticos apoiando políticos com discursos extremistas similares aos utilizados na Idade Média. Banalizam os crimes perpetuados por ditaduras civil, empresariais e militares, conclamam a retirada dos direitos conquistados por minorias, recorrem a discursos preconceituosos e sexistas afirmando que estão defendo a instituição família. Propõem a retomada de ações destrutivas e excludentes: as queimas de livros e de reputações – o lawfare* é a nova roupagem da 'caça às bruxas'.

Para estabelecer suas pautas, realizam acordos espúrios com representantes comprovadamente corruptos no campo político visando obter facilidades para a aprovação de leis que impedem o ensino ou divulgação de vias de pensamento diferenciadas das que defendem como hegemônica.

A seguir suas proposições, destruiremos os últimos baluartes do Conhecimento e apagaremos as chamas da última fogueira a sustentar a visão plural e respeitosa, não atrelada aos [pre]conceitos religiosos radicais e legalistas. Historicamente repetido de tempos em tempos, o movimento extremista é pendular e, após gerar genocídios de corpos e almas, deteriorará a vida em prol de uma suposta 'verdade'.

O objetivo final é o controle social. O que, neste momento, pode parecer banal, mas a história o comprova que é um movimento sem retorno que nos encaminhará, por meio de uma midiotização legalizada, à cauterização das consciências (já produzimos escravidão indígena e negra e genocídios de judeus, que evoluíram para o massacre racista de negros pobres, o trabalho infantil e/ou análogo ao de um escravo, e para o ataque aos estrangeiros, atualmente) e, por fim, à ignorância coletiva – que fatalmente nos levará de volta às cavernas.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 21 de setembro de 2017.

* Lawfare é dar legalidade aos abusos, manipular as leis para atingir inimigo político; é usar estratégia abusiva do direito em vez de métodos militares.

17 de set. de 2017

Furtivos escapes

Furtivos escapes, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 16-09-2017.
Furtivos escapes, criado em 16-09-2017.

Quero crer na proximidade de uma geração inventora, contra todas as previsões contrárias. Uma que acolha mais pensamentos criativos que uma razão estruturadora; cujos olhos não estão, por escolha própria, obstruídos, embotados, ou com antolhos; cujo falar, ouvir e expressar provoque questionamentos, [re]avaliações, refazimentos de práticas. […] vou me permitir vislumbrar um horizonte contrário ao que o pessimismo quer me incutir.

(Wellington de Oliveira Teixeira — Por uma geração inventora )


Há uma onda desgastando e absorvendo consciências, almas e corpos, na atual configuração do país. Seu efeito aprisionante se manifesta, mais que em outros, em todos que não detém sua atenção para os fatos e suas consequências.

Mesmo compreendendo que é preciso agir para encará-la, há momentos em que o esforço não é suficiente para destrinchá-la e identificar seu sustentáculo e, com isso, construir o estímulo que permite o ir à luta para desfazê-la.

O melhor é continuar mexendo e remexendo até encontrar a brecha e escapulir ao aprisionamento. As últimas postagens carregaram essa quase agonia de querer projetar uma onda capaz de ser sintonizada por aqueles que se identificam nessa situação.

A construção de imagens e textos está conectada ao que me mobiliza para dar conta, vazão, expressão aos fluxos que atravessam meu instante. As interferências podem ser incompreensíveis e efetivamente frustrantes e paralisantes. Narrar essa trajetória é um modo de compartilhar essa angústia e dar oportunidade para intervenções e contribuições dos aliados e companheiros de jornada.

Fazer isso não é trair o processo de vida a que me propus*. Ver ou vivenciar o imobilismo é motivo maior de preocupação. Me afeta visualizar o futuro de muitos que gosto sendo desconstruído, mas cansa desenvolver sozinho diálogos educativos, pedagógicos, modos de desconstruir falsos raciocínios – não tenho pretensão de iluminar ninguém, não creio em salvadores da pátria.

Acredito, porém, que há sentido em aglutinar, em reunir colaborativamente outros para alterar a realidade de um modo ou de outro. Pode ser que, unidos, consigamos mobilizar pessoas via interseção de pensamentos críticos: produzir a chance de alguém encontrar um furtivo espaço-tempo para escapar dos aprisionamentos, forjar e estabelecer sua liberdade de ser e estar.

Meu método é investir na ampliação do acesso a instrumentos de avaliação, sinalizando os nós que encontro, apontando interesses subvertedores dos direitos individuais. Quando não funciona, fica um pouco dessa sensação de derrota, apesar do esforço despendido. O resto, não tenho como definir. Continuo persistentemente descobrindo e seguindo adiante.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 16 de setembro de 2017.

* Minha aposta de vida, o mundo que acesso é uma ilusão que meu cérebro determina por sua momentânea incapacidade de expandir a percepção. No entanto, e exatamente por isso, aposto nas interferências, naquilo capaz de me sensibilizar. Se aceito a afetação é porque necessito. E segundo as únicas regras que estabeleci para meu mundo, é em função do prazer ou do aprendizado – entendi que tudo na vida se encaixa aqui.

16 de set. de 2017

Fluxos contingenciados

Fluxos contingenciados, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 16-09-2017.
Fluxos contingenciados *, criado em 16-09-2017.

O tempo do sonho é o instante do olhar, como o clarão de um relâmpado que, subitamente, clareia a paisagem noturna. E o tempo do desejo é sempre o presente, pois é ativo de modo permanente e constante, mesmo quando expressa um Wunsch de trinta anos atrás ou mais. O desejo está sempre lá: ávido de significantes.

(Antonio Quinet – A descoberta do inconsciente: Do desejo ao sintoma, p.75)


Impulsos não tem vida própria, nós lhes damos expressão conforme as percepções pessoais se manifestam. Há pulsos que fazem vibrar ações de amor e nos permitem colocar o outro em nível semelhante ao nosso. Outros, são os monstros que espreitam, prontos para assumir a superfície e provocar danos indiscriminados.

O convívio social exigiu gerar os calabouços interiores, uma espécie de cala-a-boca para diversas forças que atuam em cada um. Mas cada um desses afetos serve como sinalizador de nossas capacidades destrutivas e construtivas e de que o resultado vai depender da combinação e dosagem utilizada. Tudo, em dose exagerada, perde sua função principal e nos encaminha aos distúrbios desnecessários.

Fluxos enjaulados, não se efetuam. Nem visibilizam o que é circunstancialmente bom ou mau, pois nada é, em si, isto ou aquilo. Precisamos da ira tanto quanto da compaixão. Alcançar esse nível de evolução pessoal é fundamental: sem ele, somos presas fáceis da manipulação. Para seres que se estruturam em equilíbrios precários, como nós, é essencial encontrar o que realmente é deletério, o que destrói a integridade, a natureza e a vida.

Há discursos que, em sua essência, objetivam semear o ódio ou visam abusar da boa vontade alheia. Nos irar permite rejeitar o que é sórdido. Pode até nos conduzir a intervir por meio de ações que os desconstroem; na contramão deles, gerar práticas que constroem elementos que capacitam e produzem superação e ultrapassamentos. Mas, cuidado!, é fundamental não moralizar: cada um tem seu processo individual e exclusivo, mas este não precisa tornar-se excludente. O que, hoje, quem produz tais discursos crê, pode mudar, amanhã, alterando suas práticas, também.

Por uma outra via: itens do caminho, os que são preservados, tornam-se significativos porque fazem uma narrativa de vida. Certamente, você já amou e odiou, já acertou e errou, já conquistou e perdeu. Essas não são oposições conceituais, apenas. Representam os pequenos blocos que o constituíram. Agrupados em diversas configurações, manifestam o ser diferenciadamente, a cada situação.

Não importa o que você guarda dentro de si ou expõe para todos, tudo depende do uso que lhe é dado. Desse modo, não cabe desqualificar elementos do passado em função de práticas renovadas ou mais eficientes. Todos foram fundamentais à evolução pessoal. Há momentos para levar os monstros para passear, sim. Mas considere que, na vida, tudo exige equilíbrio e somente nele efetivamos essa sensação de plenitude e encontramos nosso lugar no mundo e na Ordem dos acontecimentos.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 16 de setembro de 2017.

* O inconsciente já foi entendido como o subterrâneo de um indivíduo, o local onde estariam reprimidos os impulsos destrutivos para ele: a prática de jogar para debaixo do tapete e manter as aparências.
Outras vias de pensamento tentam realizar uma releitura, compreendendo que o que é em determinado momento contido, por ser socialmente indesejável, sempre se manifesta em alguma outra circunstância. É preciso que não sejam contidos, mas contingenciados, que surjam como imagens para refletir (e permitir refletir sobre) os desejos obscuros. Sem isso não é possível colocá-los em cheque, entendê-los.
O uso intencional e equilibrado como fonte de criatividade, de expansão e especialmente como introdutor de novidades deve ser um dos objetivos da sociedade. As academias de arte perceberam isso e foram amplamente beneficiadas com a produção dos filmes de terror e suspense e outras formas de expressão.
O desafio é demonstrar que o 'dar vazão' é algo imprescindível, pois nos subterrâneos da alma esses fluxos contidos corroem o ser e geram as anomalias e distúrbios, as sociopatias. Mas, expressados de forma positiva voltam a ter sua função primordial, peso ou medida que compõe o equilíbrio das forças e permitem emergir um sujeito apto para a integridade e plenitude.

14 de set. de 2017

Modos de vida guetificantes

Despressurizando, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 14-09-2017.
Despressurizando, criado em 14-09-2017.

Os laços entre nós e uma pessoa somente existem em nosso pensamento. Ao enfraquecer, a memória os afrouxa e, apesar da ilusão de que desejaríamos ser vítimas, e com a qual, por amor, por amizade, por delicadeza, por respeito humano, por dever, iludimos os outros, nós existimos sozinhos*. O homem é o ser que não pode sair de si, que só conhece os outros em si, e se diz o contrário, mente.
(Marcel Proust — Albertina desaparecida, p.48)


As relações sociais nem sempre se estruturam por acordos pacíficos. Qualquer imposição, mesmo as bem sucedidas, produzem um amargo gosto em quem a engoliu porque se transforma em veneno. Claro que qualquer droga em uma pequena dose pode remediar, mas em doses maiores tende a matar.

A história ensina que os fluxos acabam se tornando pendulares, indo de um extremo ao outro, por conta da pressão exercida para exercer um ponto de vista dominante. E tudo que é forçado e indesejado se acumula, pressionando. Um incômodo que exige encontrar ou produzir brechas para escapar. Como um balão, se não o ar não for expelido, despressurizando a tempo, explode.

A eclosão de uma estrutura aprisionante pode exigir uma atividade em tal grau de potência que pode ser comparável a um tsunami, varrendo todas as superfícies. Mas ele surge silenciosamente, em meio a outras ondas. Quem diria que, por um acaso, algumas se reuniriam com outros elementos naturais e comporiam um dos maiores espetáculos da natureza? Destrutivo? Não apenas. Após sua passagem, a paisagem se recompõe, de um modo ou de outro. A única coisa que permanece é a dor da tragédia que se abateu.

Algumas pessoas reagem de forma violenta aos aprisionamentos, outras decaem por suas fragilidades e optam pela inexistência. Em qualquer dos casos, uma tragédia anunciada: as rachaduras vão se expondo porque a pressão exercida se amplia e vai sendo continuamente ignorada.

Como sociedade, é preciso desenvolver modos de convivência que não sejam guetificadores, separatistas e excludentes. Mesmo quando há questões morais. Não é preciso esforço para identificar que há diversas e não apenas uma moral, como os fundamentalismos tendem a afirmar. É preciso reaprender e ensinar o uso das sutilizas, da atenção particularizada, do buscar no outro o subsídio para entender as suas e as nossas próprias questões.

Como o ponto mais importante a se ressaltar, somente com envolvimento crítico, visando uma reabertura à vida colaborativa e cooperadora, será possível mudar a realidade e desestruturar os aprisionamentos, de forma pacífica; antes que o sejam pela via da revolta, dos confrontos e da destruição.

Não somos seres 'naturalmente' pacíficos ou guerreiros; somos um construto que vai se estabelecendo nos inter relacionamentos. Podemos nos agrupar para nos defendermos uns aos outros, por uma opção de vida. Do contrário, resta apenas essa luta para pisar no outro em nome de um modo de vida vendido como o melhor: a questão que você deveria fazer é '— Para quem?'.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 14 de setembro de 2017.

* Esse pensamento propõe que o maior gueto imposto a um ser humano é própria existência, isolada e solitária. Mas, traz uma concepção de que é preciso gerar as estruturas do outro, torná-lo alguém, dentro de si mesmo. O processo é voluntário, e o único capaz de permitir um olhar diferenciado sobre nós mesmos e sobre o outro: entendendo-o como um igual e com isso, desconstruir os segregacionismos.
Gueto
(do italiano ghetto) região em que são confinados os membros de uma etnia ou de grupo minoritário, devido a pressões ou questões econômicas ou sociais. Na Segunda Guerra Mundial, guetos eram regiões urbanas que isolavam e concentravam a população judaica local. Os alemães estabeleceram pelo menos mil guetos na Polônia e na União Soviética.
Atualmente, qualquer estilo de vida ou tipo de existência resultante de segregação ou tratamento discriminatório.
O gueto de Varsóvia ficou famoso pela resistência que ofereceu à dominação nazista. Hoje, grupos ativistas promovem a desguetificação, questionando as segregações e preconceitos e promovendo uma sociedade mais igualitária.
Formação socioespacial delimitada, racial e/ou culturalmente uniforme, baseada no banimento forçado de uma população negativamente tipificada (..) para um território reservado no qual essa população desenvolve um conjunto de instituições que operam ao mesmo tempo como substituto das instituições dominantes da sociedade abrangente e como neutralizador contra elas.

10 de set. de 2017

Receptáculos

Receptáculos, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 10-09-2017.
Receptáculos *, criado em 10-09-2017.

A estrada é longa, com muitas curvas sinuosas que nos guiam quem sabe para aonde.
Mas eu sou forte, forte o suficiente para carregá-lo: ele não é um peso, ele é meu irmão.
Assim prosseguimos: seu bem-estar é de meu interesse. Não é nenhum fardo a suportar
Chegaremos lá! Ele não me atrapalha, ele não é um peso; ele é meu irmão.
Fico sobrecarregado de tristeza porque nem todos os corações
estão repletos da alegria, do amor de um para com o outro.
A estrada é longa e não possui retorno. Durante o percurso, por que não compartilhá-la?
Assim, a carga não vai absolutamente me pesar: "Ele não pesa, ele é meu irmão!"

(Bobby Scott e Bob Russell — He ain't heavy, he's my brother, trad. livre)


Há pesos que carregamos e nos oprimem por impedir a manifestação de um ser completo e pleno. Certas obrigações que não se relacionam com um processo de busca e compreensão do necessário, do essencial ou mesmo daquilo não nos oferece um prisma, por pequeno que seja, de um vir a ser mais evoluído. Os outros, esses são dons de vida, desafios fundamentais para encontrarmos e manifestarmos as capacidades e potencialidades, inclusive aquelas de inclusão, colaboração e participação: o todo só existe com a integração de suas partes e quando cada uma é plena em si mesma.

Essa visão de mundo, carregada de um certo otimismo – acredito eu que sóbrio e equilibrado – com relação aos acontecimentos, dificuldades ou relaxamentos, singularmente vividos e, de vez em quando, absorvidos na composição de um si mesmo legítimo. Certamente alguns dos passos durante, trechos e recortes de um dia ou de um período de vida, são árduos, exigem uma vontade férrea de ir adiante, propõem valores que ultrapassam o olhar apenas sobre si mesmo. São estes que sinalizam: podemos e devemos ser companheiros de vida, parceiros de jornadas, cooperadores uns com os outros.

Claro, isto exigirá abdicar do passo mais rápido, em alguns momentos, em prol de tornar-se o apoio ou sustentáculo para não permitir que uma construção desabe sobre si com as intempéries da vida. Mas eu garanto: empatias e solidariedades retornam em produção de devires mais conectados com o que está por aí, com os elementos que precisamos aglutinar para compor nossas potências pessoais. Nem sempre o que temos a doar é o necessário para alguém, e isso não nos torna desqualificados; os encontros são seletivos e os fluxos só deveriam se reunir quando há compatibilidades a serem compartilhadas.

Essa dose de egoísmo é ímpar, ela nos ensina que um mundo melhor para se viver depende do ambiente e das companhias que tenho ao redor. Somos seres únicos, nascemos e morreremos sozinhos; no ínterim, constituímos as possíveis narrativas dessa caminhada ao optar por composições com aquilo que exprime potência por si e, ainda assim, não se nega a estabelecer novas formações.

Um olhar acurado não é aquele que determina o outro, mas o que permite refletir-se no outro e nesse processo obter a compreensão, o entendimento e a sabedoria. Alguns estão rastejando, outros engatinhando, muitos mais dando os primeiros passos e subindo os degraus. Todos nós, por uma fração de segundo que seja, podemos nos inserir na Ordem e Nela constituir as ousadias, as coragens, as determinações e vontades que nos impulsionam para o adiante.

Gosto de uma alusão que propõe que as percepções variam entre o que está estabelecido e o que é desejável. Em algum momento, quem sabe, a chama acende, a taça se preenche e o todo se manifesta num adeus à forma para ir ao encontro do desconhecido. O incognoscível só o é enquanto não estamos aptos a apreendê-lo e assimilá-lo com a forma ou conteúdo que alcançamos atualmente com nossa percepção e práticas de vida.

Reafirmo, o processo de vida é único e intransferível, mas admite prazerosamente as interações, que não outras, as do aprendizado com os processos estabelecidos por outros: alteridade é fundamental na construção da individualidade.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 10 de setembro de 2017.

* Indico porque gostei muito de assistir ao vídeo: The Justice Collective. Meus sinceros agradecimentos a Genésia Santana de Araújo (uma mãe pra mim!) pelo envio, nesta manhã, que me inspirou esse artigo.

Reconheça os cantores que participaram deste projeto de arrecadação de fundos:
Andy Brown (Lawson),
Gerry Marsden (Gerry and the Pacemakers),
Paul Heaton (The Beautiful South),
Glenn Tilbrook (Squeeze),
John Power (Cast and The La's),
Robbie Williams (Take That),
Melanie C (Spice Girls),
Rebecca Ferguson,
Holly Johnson (Frankie Goes to Hollywood),
Paloma Faith,
Beverley Knight,
Eliza Doolittle,
Dave McCabe (The Zutons),
Peter Hooton (The Farm),
Ren Harvieu,
Jon McClure (Reverend and The Makers),
Paul McCartney (The Beatles),
Shane MacGowan (The Pogues),
Bobby Elliott e Tony Hicks (The Hollies),
Hollie Cook (The Slits),
Coral Gospel LIPA,
Clay Crosse,
Alan Hansen,
Peter Reid,
John Bishop (comediante),
Neil Fitzmaurice (escritor),
Kenny Dalglish (jogador de futebol).

9 de set. de 2017

Artificialização e extinção?

Artificialização, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 09-09-2017.
Artificialização *, criado em 09-09-2017.

Podemos mapear todos os milhões de espécies de seres vivos que existem na Terra, mas nunca saberemos literalmente tudo o que há para saber a respeito de uma única espécie de bactéria que seja – até porque, graças às mutações no DNA e a seleção natural, esse sempre será um alvo em movimento. A vida e os cosmos continuarão a produzir novidades, que precisarão ser escarafunchadas com paixão e precisão. Você pode ou não acreditar em um mundo sobrenatural, mas o mundo natural já contém em si a semente do inesgotável.
(Reinaldo José Lopes — Qual o sentido da vida em os 11 maiores mistérios do universo)


A natureza tende a produzir encaixes em novas configurações da realidade: a tal da adaptabilidade. Assim também os humanos com seu jogo ou guerra de gerações. O diferencial está em que a humanidade tem uma tendência a impor um padrão, mesmo se o objetivo anterior era o de quebrá-lo. Somos contraditórios.

Por exemplo, a pasteurização é um processo que tenta controlar a qualidade de um produto, que busca retirar qualquer traço de impureza nele e, na contramão do que se busca, simultaneamente destrói os elementos que, em doses inócuas, promovem o estímulo às defesas orgânicas, a saúde como um todo.

A pasteurização social se visibiliza pela repetição previsível dos comportamentos, manipulações das práticas de modo a gerar uma hegemonia e sua reprodução indefinida. No que torna seres humanos previsíveis, controláveis, manipuláveis, presas fáceis, tem produzido extinções como as da criatividade e da produção do 'si próprio', perdido em um 'si genérico'. Esse tipo de humanização pode estar gerando efeitos nefastos na natureza.

Prefiro escapar, por enquanto, da desqualificação ou da moralização deste processo. Vou tentar capturar as minúcias, as pistas (pense nisso: as práticas sempre mudam em função de seu ambiente) para constituir um cenário possível das consequências imediatas da nossa inserção na artificialização da vida.

Algo que vai na contramão do que os aferrados à modelação dos comportamentos (fundamentalistas, dentre outros) tentam obliterar e insistem em ignorar: só na diversificação há permanência. Há em todas as épocas um determinado tipo de evento (como uma peste) que dizima parcialmente a humanidade e a extinção só não ocorre por conta da diferenciação que gradualmente ocorre no processo de evolução natural e das práticas diferenciadas.

Sob esse ponto de vista, as mutações, as fugas do padrão ou da normalidade são o que há de mais eficaz na preservação das espécies. Um paradoxo, é verdade — mas quem disse que a Ordem usa o mesmo raciocínio que essa espécie que se considera sapiens ou sábia?

Sempre ocorreram, é verdade, mas o atual ritmo não deve ser ignorado: as transformações nas funções cerebrais e no corpo humano estão se radicalizando e começamos a detectar seus efeitos nos comportamentos. A virtualização está remodelando os órgãos sensoriais e a estrutura de sustentação corporal. Fato preocupante, porque acelerados artificialmente. Ultrapassamos as fronteiras dos escrúpulos, em nome das ganâncias, em especial as dos conglomerados empresariais farmacêuticos e de agrotóxicos globalizados.

Só que, quando as vias comuns não são efetivas, a natureza promove rupturas marcantes, especialmente se a devastação ultrapassar o contexto de espécie, aproximando-se de sua própria extinção. Mudanças genéticas vêm ocorrendo em todas as espécies em um ritmo incomum. É possível supor que para enfrentar essa tentativa de apropriação da cadeia natural e os desastres resultantes das intervenções da humanidade.

Ainda que escalas evolucionárias exijam milhares de anos para efetivar qualquer diferenciação completa e autônoma, o interstício, o período intermediário e de transição é composto por um convívio – geralmente não pacífico – entre os que estão dentro dos conformes anteriores, observando sem entender ou explicar o surgimento e proliferação da mutação. A a tentativa de erradicação do diferente tem sido a prática predominante. Mas, e se o minoritário, de repente, tornar-se um salto evolutivo, e modificar o jogo da preponderância e do predomínio, estaríamos encarando nossa próxima evolução?

Wellington de Oliveira Teixeira, em 09 de setembro de 2017.

* E daí que as opiniões divirjam? Que o campo das ideias seja sempre de batalhas? Não é disso que a proposição acima trata. Ser é a única questão que cada corpo-alma-espírito carrega como próprio. Somos um amontoado de partículas e particularidades assimiladas num percurso. Certo. Mas as formas de constituição diferem. E muito.
Algo recentemente tem me causado um grande incômodo: a verdade não importa, somente sua aparência, aquilo que pode substituí-la porque opera em nome da resolução de algum medo da expressão de si mesmo.
Todo incômodo tem seu lado provocador, instigador que, se bem utilizado, promove transformação. Minha questão relaciona-se a identificação de uma prática retomada atualmente de se escudar em algo ou alguém para expressar ódios, rancores, insatisfações e irritação com diversas situações — perpetuando práticas de fundamentalismos que eu pensava estar ultrapassados. Nessa cadeia de atitudes e práticas, a identidade pessoal é sobreposta.
A negação e a projeção, mecanismos de proteção pessoal, extrapolam para o apagamento da personalidade. Lidamos com a adoção de avatares que possuem corpos. A virtualização desconstruindo as vivências. A imitação e o mimetismo produzindo artificialidades e estas, possivelmente, à extinção do sujeito humano, realizando a especialização do assujeitado como padrão.