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31 de ago. de 2008

Natureza oculta

Natureza oculta, criada por Wellington de Oliveira Teixeira, em 31/10/2008
Natureza oculta, criada em 31 de outubro de 2008


…faço poesia não porque seja poeta, mas para exercitar a minha alma,
é o exercício mais profundo do homem.
(Clarice Lispector
- Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres)

Os dias passam por nós, num tempo que parece cada vez mais veloz. Estamos sempre agindo, agitando, agenciando algo, agregando algum valor aos nossos bens. Até mesmo o tempo de descanso é algo que tem se caracterizado pela velocidade: precisamos aproveitar o máximo de tudo o mais rapidamente possível. Parece que a contemporaneidade nos trouxe como questão principal o maximizar as ações no menor tempo possível.

No dia a dia, o que temos são paixões breves, sinopses de livros e filmes, mini-séries, produtos descartáveis e tudo que dura um pouco mais parece estar entrando na categoria dos obsoletos, ultrapassados, fora de moda.

As pessoas buscam cada vez mais encontros intensivos e para isso desqualificam o extensivo. Por que levar uma semana para fazer algo que pode ser feito no primeiro encontro?

Qual o nome mesmo daquela pessoa que ficou com você na semana passada? Do que ela gostava? Quais os seus desejos e sonhos? E o seus?

Não é questão de moralismo, de forma alguma. É apenas refletir que alguns de nós que ainda desejam um pouco de intimidade, de companheirismo, de compartilhamento de vivências estamos nos sentindo coagidos a agir de uma maneira muito estranha ao nosso ser, estamos nos permitindo um trajeto muito diferente do que nos proporcionaria uma real satisfação para não nos tornarmos estranhos em nosso próprio meio, apenas mais um elemento que não se encaixa no padrão social.

Creio que há diferenças entre as épocas nas relações interpessoais e é isso que eu quero refletir: nossa época está se tornando uma das que mais falam em inclusão e é exponencialmente excludente.

O uso das coisas e das pessoas, incluindo aí as suas habilidades, sempre existiu e não vejo como isso possa mudar seja nas relações profissionais, interpessoais ou uniões afetivas.

De uma forma assutadora todos agora estão impelidos a serem jovens, felizes, bem sucedidos, uma espécie de modelo empreendedor-conquistador.

E cada vez menos refletimos sobre nós mesmos. Refletimos os pensamentos e os desejos dos outros a nosso respeito. Respeito esse que quase não está mais disponível porque precisamos ser disponíveis cem por cento de nosso tempo para tudo e todos ao mesmo tempo.

E fica pra mim a pergunta 'Quem é esse eu que digo a todo instante e quem é esse eu que afirmam que sou, até mesmo amigos mais próximos?'.

É como uma natureza oculta que ficou tão soterrada pelo cotidiano insano que me força a ser um arqueólogo para escavar profundamente e ir encontrando pequenos sinalizadores que possam me remeter ao ser que originariamente era chamado de eu. Nessa aventura, cada descoberta me faz sentir um pouco melhor, um pouco mais feliz, um pouco mais íntegro, um pouco menos burro e espoliado de mim mesmo.

Wellington de Oliveira Teixeira, 31 de outubro de 2008.

* Resolvi postar a partir de agora algumas reflexões contemporâneas até me sentir inteiro novamente para ver meu passado passar por mim.