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24 de jun. de 2013

Bolsa Estupro: a anomalia que legitima o estupro e corrói a alma da vítima.

História sem fim, criado por Wellington de Oliveira Teixeira, em 16/06/2013
História sem fim, criado em 16/06/2013.

Há séculos está claro em que lugar nos situamos aproximadamente no reino animal.
Obviamente somos mamíferos, o grupo de animais que se distingue por ter pelos,
nutrir os filhotes e outras características[…]
O meu propósito ao estudar essa situação é ajudar a evitar a repetição dos nossos erros
- usar o conhecimento sobre o passado e as nossas propensões para mudar o nosso comportamento.

Jared Diamond - O terceiro Chipanzé: A evolução e o futuro do ser humano.


Controversa desde a sua formulação, há um certo consenso de que o chamado Estatuto do Nascituro é uma reação a decisões do Supremo (interrupção da gravidez de anencéfalos e às pesquisas com células-tronco de embriões) e à garantia prevista no Código Penal de 1940 (artigo 128, que permite o aborto em caso de violência sexual).

Tema polêmico, principalmente por interferir com avaliações ou entendimentos do que se seja a vida (a caracterização legal de seu início), a proposta que se encontra no Congresso recebe crítica ferozes e apoios acolarados e é entendida de modo diverso por religiosos e não religiosos. O que segue é uma exposição do meu ponto de vista.

O contexto atual

Não importa se são bebês, crianças, adolescentes, adultas ou de terceira idade, segundo a ONU, no mundo, uma em cada cinco mulheres será vítima de estupro ou tentativa de estupro ao longo de sua vida - cerca de 1 bilhão de mulheres. Grande parte delas com consequente gravidez indesejada.

Como ficam, tendo que encarar a criminalização de todas as formas de aborto, inclusive as que são, atualmente, garantidas pela Constituição e outras leis como casos de risco de morte da mãe, de anencéfalos* e em casos de violência sexual?

1) O viés legal

O projeto tem sido classificado como neoconservador por retroceder o mínimo obtido em caso de estupro e risco de vida e por alterar o critério clínico atual para se estabelecer o início-fim da vida com a atividade cerebral, inclusive para os casos de doação de órgãos (morte encefálica). Por esse critério, até a 12ª semana de gravidez, o feto não possui atividade cerebral, não se constituindo (ainda) uma nova vida. A alteração, na prática, irá criminalizar todas as formas de aborto (inclusive em casos de estupro, risco de morte da mãe e anencéfalos).

2) O viés técnico-científico

Ao impedir as pesquisas com células tronco no Brasil vai gerar um grande atraso aos avanços da ciência (medicina, genética, e toda tecnologia), tornando o país dependente (subserviente, importador de remédios e mais atrasado) em relação aos países mais desenvolvidos. As consequências disso, são população mais doente e remédios mais caros e inacessíveis à população de baixa renda, por serem essas pesquisas as mais promissores em termos de tecnologias para curas de diversas doenças de grande impacto.

3) O viés social

É criticado por ser um incentivo a mulheres pobres ter filhos de estupradores (mulheres ricas recorrem a clínicas de luxo ou hospitais para interromper uma gravidez indesejada) ou procurar enfermeiros, parteiras, clínicas clandestinas (morrendo nas mãos dos 'açougueiros') e indiretamente favorecer a própria ação desses criminosos. Também é avaliado como um desrespeito a mulher estuprada e violentada retirando sua autonomia, direito à saúde e dignidade para decidir se quer ou não proceder com uma gravidez indesejada. Em questão de proporcionalidade de benefícios sociais, questiona-se o porque de dentre os milhões de brasileiros nascidos anualmente, cuja maioria encontra-se em situação de risco social (economicamente desfavorecidos), por que somente os frutos de estupro deveriam ser mais protegidos pelo Estado? É considerado um mecanismo bizarro a criação de uma pensão para mulheres vítimas de estupro: priorizando o direito do estuprador, o direito do feto em detrimento do direito da mulher que foi vítima de uma violência.

4) O viés psicológico

Em relação a intimidade da mulher estuprada, o ato hediondo produz, além dos físicos, um sofrimento psíquico que ela carregará para o resto da vida, com todos os traumas decorrentes. A proposta da lei amplia o as suas consequências ao impor um convívio permanente com o sofrimento e os traumas decorrentes do ato do estupro: obrigatoriedade de registrar a criança (concebida por violência ou grave ameaça e não pela vontade dos genitores), em nome do pai estuprador; recebimento de uma pensão alimentícia específica de estupro; direito ao estuprador do exercício, mesmo que distante, da guarda do filho (dependendo da situação, pleitear esta guarda judicialmente).

Assim, as propostas que carregam incentivo financeiro acendem de forma incessante as marcas de uma agressão, constituindo-se uma violência à dignidade humana. Promove uma inversão de valores: tentando defender a vida promove-se morte psicológica da mulher/mãe e da criança/fruto do estupro.

Com relação às possibilidades apresentadas pela proposta da lei, ninguém, em sã consciência, vai acreditar que alguém nascido nessas condições terá os cuidados necessários à saúde psicológica oferecidos por uma pessoa que está em sério grau traumático. E, certamente, colocá-los em centros para menores (local em que ficarão até uma quase que impossível adoção) - confirmadamente fábrica de transgressores e criminosos na realidade brasileira - não fará diferença para melhor.

5) O viés da Paternidade

Estuprador não é pai é um criminoso sem qualquer vínculo afetivo com a vítima, mas ganhará esse status e terá todos os direitos relativos aos verdadeiros pais.

Dar status de paternidade ao estuprador, obriga a uma relação de proximidade com ele para a estuprada e a criança. Isso é uma legitimação da violência sexual.

A tentativa de remedear a vítima com um valor mensal (a chamada bolsa-estupro) só a expõe mais ao fato de não haver relação materno/paterna no contexto. A criação da Bolsa Estupro é uma anomalia em todos os sentidos.

Por tudo isso, eu creio que não é ainda um momento propício para a produção de uma legislação a esse respeito. A sociedade precisa amadurecer a temática. Não é na marra que isso acontecerá. Assim, a classifico como oportunismo político: não visa a criação de uma sociedade consciente ou de medidas socioeducativas e preventivas ao estupro e suas consequências, do modo como está apresentada. A falta de legitimidade dos legisladores atuais - inclusive a da bancada evangélica, sua defensora - não apenas trará insubordinação e o desrespeito à Lei, como ainda promoverá ações do submundo - criminosas como as do tráfico - já que o Estado não dá condições para resolver a questão da gravidez indesejada, fruto de estupro.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 24 de junho de 2013.

*Um recém-nascido com anencefalia geralmente é cego, surdo, inconsciente e incapaz de sentir dor. Alguns nascem com tronco encefálico, mas a falta de um cérebro funcional impossibilita a consciência e ações reflexas. Um resumo básico se encontra em : http://pt.wikipedia.org/wiki/Anencefalia

16 de jun. de 2013

Pense numa história sem fim…

História sem fim, criado Wellington de Oliveira Teixeira, em 16/06/2013
História sem fim, criado em 16/06/2013

Diz a tradição que, no segundo antes de nossa morte, cada um se dá conta da verdadeira razão da existência.
E nesse momento nasce o Inferno ou o Paraíso.
O Inferno é olhar para trás nessa fração de segundo
e saber que desperdiçamos uma oportunidade de dignificar o milagre da vida.
O Paraíso é poder dizer nesse momento:
"Cometi alguns erros, mas não fui covarde. Vivi minha vida e fiz o que devia fazer."
(Aleph - Paulo Coelho)

A coragem de viver: deixo oculto o que precisa ser oculto e precisa irradiar-se em segredo.
Calo-me.
Porque não sei qual é o meu segredo. conta-me o teu, ensina-me sobre o secreto de cada um de nós.
Não é segredo difamante. É apenas isto: segredo.
E não tem fórmulas.
(Água Viva - Clarice Lispector)


É preciso ser criativo, dia após dia, para enfrentar a multidão de acontecimentos que se encara quando há o desejo de estar vivo e não de apenas sobreviver.

Não creia ser esta uma tarefa que alguém possa definir como fácil. Quanto mais experiência temos (nas entrelinhas, mais velhos ficamos) maior o entendimento de que a maleabilidade é uma ferramenta maravilhosa para lidar com as questões que nosso desenvolvimento pessoal propõe, mas como é difícil aprendermos a utilizá-la!

Pode ser uma suposição inexata a que faço, mas, vai precisar de um bom jogo de cintura qualquer um que busque ultrapassar aquelas determinações imbecilizantes e paralisantes que baseiam a vida daqueles que têm medo de tentar, buscar e descobrir motivos e razões antes de, efetivamente, adotar um pensamento ou uma prática.

Tudo bem, a experiência ancestral que nos foi transmitida por meio de costumes e práticas (ou mesmo a genética) tem um impacto grande em nossas construções de valores e com eles os modos de nos conectarmos a determinados grupos sociais e à sociedade como um todo. De forma alguma quero propor um abandono dessa herança.

Desde aqueles pequenos cuidados com a saúde como um chazinho, a canja, a maravilhosa combinação do feijão com arroz brasileira e tantas outras, até a legislação que nos rege o convívio social, foram séculos de aprendizado do tipo prático que só agora recebem atenção das ciências e comprovação oficial.

Mas, e com muito cuidado expresso isso, aquele aprendizado poderia ser outro em outro contexto. E, com os instrumentos que dispomos atualmente, cada um de nós - e não apenas os cientistas - pode fazer suas próprias inferências, descobertas e, especialmente, reavaliações.

Por exemplo, a lógica que possuíamos de enviar mensagens é clássica: papel, caneta ou máquina de datilografar, envelope, selo e Correios, prazo de chegada e prazo de retorno da mensagem. Tudo transformado com o telefone e as mensagens eletrônicas (famosos e-mails, no inglês). É impensável para a nova geração a lógica simples que existia. E com razão: diante de instrumentos novos devem surgir práticas novas.

Por que, então, não somos capazes de nos atualizarmos em tantos outros aspectos? Por que a contextualização não faz parte de nossa vida? Por que aquela velha e querida ranzinza não cede lugar às novidades, às invenções, às transformações?

Tudo bem. E vou concordar completamente com aqueles que pensaram que é preciso avaliar todo e qualquer novo comportamento, o novo em si não é sempre o melhor.

O melhor exemplo que encontro é com relação aos produtos descartáveis e os com obsolescência programada (data de validade). Se antes, um eletrodoméstico durava a vida do seu comprador, isso mudou muito. As lâmpadas duravam séculos, hoje, se muito, um ano. Antes um produto que apresentava defeito era consertado, hoje há o estímulo para comprar o novo e descartar o com problemas.

Certamente essa mentalidade nova nos trouxe questões a serem avaliadas - entre elas, uma bem importante, a dos relacionamentos.

Mas, como tudo que é novo, é necessário um tempo de adaptação, de descoberta da melhor forma de uso e da utilização consciente.

E é aí, que os que desenvolvem em si uma preguiça mental, emocional e até espiritual, se atém ao passado, ao já determinado e o transforma em fixidez, esquecendo que ele foi fruto de mudanças.

Bem, eu comecei pedindo para você pensar em uma história sem fim, não foi? Pois é. Essa é a sua história. E é o seu encontro com a vida e sua participação nas redes de interconexão deste mundo que pode fazer dessa história algo pobre e chato ou algo rico onde cada episódio é capaz de produzir uma imensa vontade de ir adiante e de descortinar os horizontes que trará o capítulo seguinte.

Repito, e dessa vez com uma ternura que poucas vezes possuo, tome a sua vida nas suas mãos com carinho, aceite o desafio de refazer-se diariamente, construa algo novo que fique como uma marca sua para quem vier junto ou depois. Todos precisamos ir ao encontro de nossa própria plenitude como ser. Para alguns que acreditam de uma determinada forma eu diria: um guerreiro que alcança estatura da perfeição.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 16 de junho de 2013.

Sabe aquela vontade que dá de apreciar um bom vinho, saboreando os detalhes de uma boa massa? Não permita a velha e horrível máxima 'vontade é coisa que dá e passa'.