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26 de dez. de 2013

A sustentabilidade emocional

basta amar, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 20-12-2013
basta amar, criado em 20-12-2013

Aí não haverá mais grego nem judeu, nem bárbaro nem cita, nem escravo nem livre,
mas somente Cristo, que será tudo em todos.
Portanto, como eleitos de Deus, santos e queridos, revesti-vos de entranhada misericórdia,
de bondade, humildade, doçura, paciência.
Suportai-vos uns aos outros e perdoai-vos mutuamente, toda vez que tiverdes queixa contra outrem.
Como o Senhor vos perdoou, assim perdoai também vós.
Mas, acima de tudo, revesti-vos do amor, que é o vínculo da perfeição.
Triunfe em vossos corações a paz de Cristo, para a qual fostes chamados a fim de formar um único corpo.
E sede agradecidos.
(Bíblia - Colossenses 3:11-15).


Conheço muita gente. Me tornei amigo de algumas e o inverso também ocorreu.

Dentre aqueles que tive a oportunidade de acompanhar ou conviver por mais tempo, alguns me surpreendem até hoje pela capacidade conhecida como resiliência. Enfrentam constantemente situações de alta complexidade, sofrem com intensidade e carregam marcas no corpo e na alma. Resistem, ultrapassam e superam.

Me encanta essa disponibilidade para a vida, que até mesmo acontecimentos sórdidos não consegue desfazer.

Ponto em comum que consegui alinhar pela observação e contato foi uma forte carga emocional que tende a ser positiva: veem os acontecimentos como produtores de aprendizado e crescimento pessoal ou como um desafio a ser superado pela fé.

Todos encaram não como super-heróis as situações, não se isolam, buscam na participação de pessoas de confiança o apoio. De certa forma, é esse suporte emocional aliado ao aprendizado anterior que os permite atravessar o momento e a dificuldade sem caírem pelo caminho.

Esse ano, nas postagens de rede social, vi muitos pedidos de amigos que precisavam desse suporte. Enfrentaram situações drásticas que atingiram a si mesmos ou a pessoas muito próximas. E o impacto gerado foi avassalador. Vi, também, o retorno de muitos com palavras de conforto, de incentivo e de solidariedade. E foi com essa ampla rede sustentadora que o dia-a-dia de alguns desses meus amigos foi conquistado e seus males minimizados.

Está até parecendo que estou escrevendo algo como os conselhos que infestam os livros de 'auto-ajuda'. Mas minha meta diverge disso. O que pretendo é demonstrar que cada um tem o enfrentamento necessário para a sua vida. Deve encará-lo singularmente, pois é uma luta pessoal. A rede de apoio é algo a se acessar nos momentos em que a lucidez não é uma companheira. Não é um suporte fixo, onde me jogo e todos me seguram, menos eu.

Creio que o sinal que deve ser dado é: me incentive a ultrapassar; me mostre os pontos fortes que possuo, pois não estou vendo neste momento; amplie minha rede de contatos naqueles lugares que ainda não fiz algum; participe desse momento naquele aspecto em que eu sou imaturo ou sem aliados.

Bem, presença física, em alguns casos é essencial. Mas, talvez, na maioria dos outros, um bate-papo, uma mensagem, uma imagem com mensagem clara relativa à situação, podem ser a melhor opção. Permitem aquela solidão que impulsiona o ultrapassamento.

Acredito que seres humanos são dotados de uma capacidade de enviar pensamentos, sentimentos e outras formas de energia para outros, assim (repito, é uma opinião minha), uma rede de seres desejando intimamente um bem a outro podem influenciar o campo de forças que essa pessoa se encontra e auxiliá-la a atravessá-lo.

Por isso escolhi como tema sustentabilidade. Há um texto bíblico que exorta esta rede com um 'suportai-vos em amor'. E minha turma, rapidamente, passou a usar numa brincadeira, a de ter que suportar um sujeito chato. Mas tive a oportunidade de estudar um pouco mais profundamente o texto e verificar que falava de um conjunto de pessoas que com a manifestação de seu amor formam uma viga de sustentação. Peças em um emaranhado que auxiliam no completar o quebra-cabeça.

Hoje, embora busque até o último momento seguir com minhas próprias forças, não me impeço de recorrer àqueles que confiantemente me permito estar próximo para buscar a crítica, auxílio na elaboração de estratégias de vida para mais uma vez vencer um desafio.

Somos únicos. Indivíduos que nascem e morrem sozinhos. Mas nada nos impede de, ao percorrer este intervalo, nos aliarmos e nos fortalecermos naquilo que cada um traz de melhor em si.

Por isso, desejo que tudo que intento em favor daqueles que amo (dos conhecidos e dos desconhecidos) possa se concretizar: um mundo onde o respeito à diversidade inerente ao ser humano produza a paz.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 26 de dezembro de 2013.

* Notas

17 de dez. de 2013

Ousar ser mais que uma parte

Ousar, criado por Wellington de Oliveira Teixeira, em 17-12-2013 Ousar, criado em 17-12-2013

Seus atos, bem como os atos de seus semelhantes em geral, parecem-lhe importantes
porque você aprendeu a pensar que são importantes.
Aprendemos a pensar sobre tudo — disse ele — e depois exercitamos nossos olhos para olharem como pensamos a respeito das coisas que olhamos. Olhamos para nós mesmos já pensando que somos importantes. E, por isso, temos de sentir-nos importantes! Mas quando o homem aprende a ver, entende que não pode mais pensar a respeito das coisas que ele olha, e se não pode mais pensar sobre as coias que olha, tudo fica sem importância […] tudo é igual, e dessa forma sem importância.

Você teme o vazio da vida de seu amigo.
Mas não existe vazio na vida de um homem de conhecimento, posso garantir-lhe.
Tudo está cheio até a borda.
(Carlos Castaneda - Uma estranha realidade pp.79-85)


Pedaços estão para além de partes de um todo.

Sabe quando você tem uma tarefa a executar que possui camadas de um roteiro a seguir ou uma construção que depende do passo anterior para poder ser executada? Na universidade me ensinaram a classificar essas partes como pre-requisitos: assim, não seria possível alcançar o topo sem percorrer os degraus.

Relativo. Como tudo, aliás.

Nossa mentalidade mecanicista só (re)afirma aquilo que ela foi programada para aceitar. Nosso comportamento padrão recompensa-castigo: meu ratinho branco e velho companheiro, Tommy, das aulas de psicologia comportamental o expressaria. Estímulo e respostas que constroem como agimos e pensamos.

Meu ratinho, parceiro de curso básico — que, para desespero das meninas, me acompanhava dentro da jaqueta às outras aulas —, ganhou esse nome por que eu havia assistido ao filme(*) de mesmo nome onde um autista era brilhante em jogar pimball (ou pebolim, em alguns locais do país). Um autismo programado.

Como o nosso.

Somos brilhantes em reproduzir o cotidiano, suas rotinas, em nos apegarmos ao costumeiro até que não haja mais qualquer gota de prazer a ser retirada das nossas práticas. E, ainda assim, continuamos indefinidamente apegados à crença de precisarmos delas para continuar.

A ruptura, que sempre é possível, precisa acontecer. Mas passei da fase da iconoclastia por si mesma. Já não sou tão punk assim.

Minha fé no poder do desfazer algo vem do crer que a energia que gastávamos para manter determinada rotina pode ser empregada para fortalecer outras diferenciadas.

Gosto de período a período fazer modificações amplas no meu habitat - além daquelas pequenas e quase imperceptíveis a outros olhos. Mas não o faço por fazer. Me obrigo a detectar uma necessidade, que aparece quando meus atos se tornam inócuos, insossos, não representativos daquilo que estou no momento.

É nesse campo propício que invisto nas tentativas de criar um novo, não apenas um renovado estar na vida. E, para obter isso, ouso coisas que não havia tentado, ainda.

Recordo-me de haver sentido esse movimento quando quis aprender a tocar instrumentos de teclas. Foi um desafio imenso para quem não tinha recurso nenhum: as pernas eram as teclas, onde meus dedos simulavam tocar um piano.

Parece um contrassenso, mas deu certo. Aprendi. E depois vivenciei um conjunto de momentos tão maravilhosos quanto inesquecíveis. Inclusive amar além de qualquer possibilidade de resistir.

Bem, isso não é confessionário. Uso o acontecimento como exemplo de o quanto o voo pode ser longo quando nos decidimos a ultrapassar o maquinismo, aquilo que em nós acredita que a roda não pode ser reinventada, que os descobrimentos são apenas tirar a coberta de cima de algo.

Uso porque quero me incentivar a viver situações como a de agora: transição.

Quero ser um transeunte da vida, não um expectador em uma estação de trem, de ônibus, de avião ou de espaçonaves. Quero ir além e transitar seus pensamentos e gerar novas emoções em você também, como o resíduo de minha vida, como a energia que se expande para além de sua fonte.

Um dia eu quis ser veículo, instrumento do sagrado em mim. Hoje entendo que não há dissociação entre mim e o sagrado, já que seu sopro é minha vida.

Ainda bem que, um dia, Deus ousou e disse "Haja Luz!".

Wellington de Oliveira Teixeira, em 17 de dezembro de 2013.

* Filme baseado na ópera rock lançada em 1969 pelo The Who. Durante a II Guerra Mundial o Capitão Walker é considerado morto em batalha. Sua esposa Nora Walker fica com a tarefa de cuidar sozinha de Tommy, filho recém-nascido do casal. Nora se envolve com Frank Hobbs, mas em 1951 seu antigo marido retorna repentinamente e é morto por Frank. O garoto Tommy presencia tudo, mas sua mãe e seu padrasto insistem que ele não viu, ouviu e não vai falar nada a ninguém, e em consequência Tommy se torna cego, surdo e mudo. Já adolescente, Tommy se torna um campeão de pinball, trazendo fama e fortuna para sua família. Depois de curado, ele se torna uma espécie de figura messiânica e angaria um culto de seguidores, que no final rejeitam seus ensinamentos e o abandonam. (http://pt.wikipedia.org/wiki/Tommy_(filme))

21 de nov. de 2013

A spinozidade da vida

spinozidade, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 21/11/2013
Spinozidade, criado em 21/11/2013

Não é por julgarmos uma coisa boa que nos esforçamos por ela, que a queremos, que a apetecemos, que a desejamos,
mas, ao contrário, é por nos esforçarmos por ela, por querê-la, por apetecê-la, por desejá-la, que a julgamos boa".
Espinoza, Ética, parte 3 prop. 9 esc.

A cada novo dia, outra teoria clássica é derrubada. Fundamentos que nos embasaram o pensamento, construídos a partir de definições pré-estabelecidas, perderam seu poder sustentador.

Bem, muitos não gostam e nem desejam aceitar que as definições que fizer se perderão com o tempo. Talvez, por isso, a temporariedade da construção do pensamento como um enigma é o que se propõe para nós outros.

Da física e da química que aprendi no fundamental e no secundário quase nada mais resta de pé. Que bom! Não tenho que me estabelecer como base de estrutura sólida, imutável, independente da variação que se estrutura no momento.

Pego o spin como exemplo: ele definia a direção do giro de uma partícula atômica. Portanto, seu campo magnético. Mas (e físicos, por favor, me ajudem), essa é uma visão muito estreita da realidade, uma vez que o fator giromagnético depende de carga, da espécie de partícula, da vetorialização e angulação, etc.

Me permitam utilizar essa entidade matemática e suas consequências como apoio para repensar meu caminho.

Em cada época, as ondulações do mar da vida produziram as condicionantes de minha apropriação da realidade. Houve épocas em que a dor era tão poderosa que nublava qualquer tentativa de raciocínio, mas o pensamento se estabelecia e produzia o necessário. Aconteceu, da mesma forma, quando era a alegria que assomava o terreno e quando todos os meio-termos se apresentaram, também.

Quem ou o que sou está diretamente relacionado com isso. A vida é isso. Momento.

E como uma mecânica quântica, o campo magnético da vida (que eu adotei com o nome de campo de possibilidades) proporciona e propulsiona atitudes, atos e encontros.

Meus queridos amigos mais jovens têm dito que me tornei hermético e com isso tenho produzido uma escrita obscura para eles. Talvez. Mas o simples preto no branco não se estabelece mais como parâmetro para minhas interpretações da realidade.

Os gestos que meu corpo aprendeu tiveram que receber adaptações ou reconstruções. Fiz o mesmo com meus julgamentos.

O olhar que produzo, diariamente, como realidade é apenas isso: uma produção e não é algo em si. O si, aí, sou eu. A realidade em mim e para mim.

Meu mundo se expandiu a ponto de acoplar outras realidades e a diferenciação se tornou o ponto central para qualquer raciocínio.

Gosto muito da ideia dos criacionistas de que Deus não repetiu nada, produziu a diferença em si, no mundo e nos relacionamentos. A beleza que observamos e vivenciamos se sustenta nisso.

O modo como cada um se propõe a vivenciar, a partir de suas próprias construções de mundo uma determinada realidade, é algo que cabe exclusivamente a essa pessoa. Assim, nossas valorações sobre o outro, seus atos, suas características acabam se tornando nada mais que uma forma de incluirmos a sua participação em nosso mundo.

Tenho sido conhecido como um ativista, especialmente com relação à Educação que considero a pedra fundamental na abertura dos mundos existentes em cada ser. Vou para a vida, participo de discussões, enfrento cacetetes por acreditar nisso.

E agora, nessa etapa de uma jornada que me é mais surpreende por não ter que se estabelecer em instituições estruturantes, e por possibilitar as (des)cobertas e (des)construções, eu honro os vínculos estabelecidos sem os laços que aprisionam. Sou grato pelos encontros que tive e por aqueles que se estruturaram de tal forma que estão aí na ordem do mundo. E do meu mundo. Sem nenhuma obrigação ou determinação de modo.

Talvez, uma das maiores conquistas da minha vida tenha sido essa: adotar, como prática, esse respeito ao tempo do outro, do momento do outro, e de estar aberto ao encontro - quando este se apresenta como possível, viável ou necessário.

Apenas uma visão (uma dentre tantas outras) que vou adotando conforme o aprendizado do ser e sua completude o exigem. Plenitude não é mais uma palavra para mim. É um desafio que altera o meu modo operandis para ser e estar de um modo pleno nessa ordem que a Ordem me permitiu vivenciar.

Se isto servir para dar partida para um outro ou novo pensamento, fique a vontade. Compartilhar é algo que me faz bem.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 21 de novembro de 2013.

* Li na wikipedia que o Spin não possui uma interpretação clássica, ou seja, é um fenômeno estritamente quântico, e sua associação com o movimento de rotação das partículas sobre seu eixo - uma visão clássica - deixa muito a desejar.

** Baruch Spinoza foi um dos grandes racionalistas do século XVII dentro da chamada Filosofia Moderna, juntamente com René Descartes e Gottfried Leibniz.

29 de jul. de 2013

A vida é como uma casa.

Reconstrução, criado por Wellington de Oliveira Teixeira, em 28/07/2013
Reconstrução, criado em 28/07/2013.

Não brinco, não. Digo apenas o que percebi. O conhecimento pode ser transmitido, mas nunca a sabedoria.
Podemos achá-la; podemos vivê-la; podemos consentir em que ela nos norteie; podemos fazer milagres através dela.
Mas não é dado pronunciá-la e ensiná-la. Esse fato, já o vislumbrei, às vezes, na juventude.
Foi ele que me afastou dos mestres.
(Sidarta - Hermann Hesse, p.118)

Não sei explicar bem. É como se pudesse sentir antecipadamente algo do meu futuro. Fluxos de emoções que tomam corpo e caem como gotas dos meus olhos. Ambíguas, como um quê de tristeza que penetra um momento bom, daqueles que podemos ter após aprendermos uma lição importante e deixarmos para trás um ciclo da nossa vida.

É como quando se consegue ultrapassar um limite, por ter tido a coragem de encarar o desafio, como quando vencemos a covardia que era uma companheira inseparável e nos permitimos lutar, apanhar mas não abrir mão.

Quase como em meio ao deserto, quando já muito sofrido, marcado pelo sol, perdendo as esperanças, surpreender-se ao descobrir que o oásis não era uma ilusão de óptica, mas um lugar para se permitir um pouco de repouso.

Gosto de obras. Pequenas construções e transformações no ambiente em que vivo. Talvez, um pedaço do meu pai que ficou em seus filhos. Aconteceu, esses dias, de ir às compras para o que anualmente me proponho: produzir a chance de renovar meus sentimentos, a forma de olhar e vivenciar o apartamento onde moro.

Dá trabalho, é cansativo, produz irritações, mas, conforme vai aparecendo o resultado o ânimo é refeito e se mantém por um bom período. O olhar ganha aquele brilho especial ao ver o que se renovou.

No hoje, maçanetas novas, estantes para a área de serviço, estruturas metálicas para equipamentos da cozinha... que vão se multiplicando com os sonhos, da mesma forma como foram a (re)pintura dos cômodos, a remodelação dos móveis anteriores - que desmontados deram origem a outros diferenciados e com nova e expressiva camada exterior.

E, num instante para o descanso, quando se para e olha para o que se fez, um sorriso se esboça, um brilho volta ao olhar e mais uma vez a energia recarrega o corpo e a alma porque é hora de aproveitar os frutos do que se plantou.

É isso. Algo simples e corriqueiro, um fugaz momento que se perpetua na alma.

Hoje re[...]assisti ao filme Tempo de Recomeçar. Como sempre, foi o suficiente para eu entender que a minha construção tem duração, mas o que dela for gerado pode ganhar a eternidade.

Sem nem mesmo sonhar com tanto, me satisfaço por me permitir entrever marcas de um possível futuro onde, diante de uma nova etapa de construções, eu possa afirmar a vida e o que ela tem de bom.

A vida é como uma casa*.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 28 de julho de 2013.

* Life as a House (2001 - no Brasil, Tempo de Recomeçar). George Monroe (Kevin Kline) é um arquiteto de meia idade com uma vida amarga que descobre-se repentinamente com câncer incurável. Decide-se por destruir a casa que o pai lhe deixou e construir uma casa para seu filho Sam (Hayden Christensen), problemático, rebelde, usuário de drogas. Aos poucos a construção proporciona a reaproximação com o filho, as pazes com Robin (Kristin Scott Thomas), sua ex-esposa e com vizinhos.

** Dedico esta postagem para a minha mãe Marilda de Oliveira Teixeira e para a Dayla Maria Perrier de Faria Valentim, aniversariantes desse mês de agosto.

15 de jul. de 2013

Nosso interno-ambiente


Conhecimentos, fotografia base: desenho no banheiro do ICHF.*

"Pois então" — pensou —, "já que todas aquelas coisas passageiras me escorregaram por entre as mãos, acho-me novamente sob o sol, sozinho, como nos dias de infância. Nada possuo, nada sei fazer, nada posso realizar, nada aprendi. Não é mesmo estranho? Agora, que já não sou nenhum jovem, que meus cabelos já ficaram grisalhos, que minhas forças diminuem, volto à estaca zero, lá onde estive em criança!" Mais uma vez, esboçou um sorriso. Sim, seu destino era deveras singular. Ele ia abaixo e novamente se encontrava nessa terra totalmente vazio, tolo, desamparado. Mesmo assim, sentia-se incapaz de afligir-se por isso. Antes, pelo contrário, tinha vontade de dar uma gargalhada, de rir-se de si, de zombar desse mundo esquisito, estúpido.
(Sidarta - Herman Hesse, p.81-82)


A novidade é a coisa mais antiga no mundo.

Está na moda o conceito de inovação. Ele carrega em si a ideia de criar algo novo, diferenciado, transformador, ruptor de uma sequência ou de um modo de ser, estar ou desenvolver.

Empresas procuram a preço de outro pessoas com o talento de produzir o inesperado e, para isso, vão buscar em locais ou práticas mais inusitados. Vou propor apenas um exemplo: músicos para empresas de tecnologia. Você deve saber que a Lady Gaga é a nova diretora de criação da Polaroid e que o William Adams, mais conhecido como Will.i.am (do grupo Black Eyed Peas), vai colaborar no desenvolvimento de novas tecnologias da Intel.

Algo estranho, que percebo por trás desse movimento de transformação, é a produção da insaciável sede consumista: o capitalismo vendendo que velho é ruim, novo é bom. Quer saber, o pior é que acreditamos nisso: dizemos que um celular ou laptop de 2 ou 3 anos atrás é uma porcaria.

Na contramão disso, o espanhol Benito Muros está sendo ameaçado de morte por causa de sua criação: uma lâmpada que dura no mínimo 25 anos - que tem por base uma que existe em um parque de bombeiros de Livermore (Califórnia), acesa há mais de 111 anos.

Poucos, talvez, conheçam o conceito, mas a Obsolescência Programada é um acordo de muitos fabricantes para desenvolverem produtos de curta durabilidade de modo a obrigar-nos a adquirir novos produtos que seriam desnecessários se produzidos como antigamente. Você pensa: até aí, tudo bem, tem sempre novidade no pedaço. Mas esquece de que o seu inconsciente absorve, também, esse conceito para as outras áreas de sua vida, inclusive a afetiva.

Apresento de forma não-moralista a questão dos relacionamentos: vejo, a todo momento, imagens e frases nas postagens de redes sociais, nos diálogos ao vivo, que há o desejo de encontrar alguém para amar, para construir um vínculo e (para alguns) constituir uma família e viver uma experiência até a morte como em UP Altas Aventuras. Na prática, apresentamos imagens dos pequenos vôos das baladas, dos encontros fortuitos em finais de semana, dos namoros que duram até a primeira briga e o status do face serem alterados. Essa incoerência surge de onde?

A questão do novo que os negociantes expõe exaustivamente em seus comerciais é a coisa mais velha que o mundo já produziu e se chama transformação: nada se perde, tudo se transforma.

Assim, o inverno dá lugar à primavera, o frio ao calor, a cobra troca a pele e você suas células mortas, as unhas, cabelos... Isso se chama renovação.

Mas a natureza ensina que não é necessário desqualificar o antigo: ele é a estrutura eficaz que permite as mudanças. É na harmonização entre o antes e o depois que se estrutura um presente.

Algumas pessoas optam pelo caminho do monge e se retiram da agitação para meditar. Querem, com isso, não impedir o novo, a novidade de vida, mas melhorar a base deste processo abrindo mão do desnecessário. Isso se chama purificação.

Como eu disse, meu objetivo não é moralização de uma forma de ser social, mas propor uma avaliação dela. A sua própria avaliação. A experiência e a observação ensinam que só precisamos ter elementos que nos ativem a capacidade de pensar, o resto somos nós que fazemos, inclusive trilhar um outro caminho.

Por falar nisso, os antigos chamavam isso de metanóia ou mudança de mente que determinava um novo rumo para a vida.

Viu?, antigos tem muito para a ensinar-aprender com os novos. Essa é a proposição simples e diária da natureza: a busca do equilíbrio.

A palavra que eu queria dizer, que só agora me tomou é transitoriedade. Exatamente o que acontece com tudo. É o Iazul! (Tudo passa!) da história de Malba Tahan**.

Existe algo na ordem do necessário que determina que parte do antigo permaneça no novo e a essa forma de permanência nós humanos aprendemos a denominar de eu. Hora de melhorarmos nosso interno-ambiente.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 15 de julho de 2013.

* Me encanto com a gurizada do ICHF - Instituto de Ciências Humanas e Filosofia da UFF. Essa é uma amostra do que eles produzem por lá e nos incentiva a reavaliar toda a estrutura de conhecimento.

** "Quando o homem atravessa período de felicidade, de alegria, de sorte e tranquilidade, deve pensar no futuro e ser comedido em suas expansões, sóbrio em suas atividades.
Convém que o afortunado não esqueça: IAZUL (isso passa). A roda do destino é incerta. A vida é cheia de mudanças.
Há ocasiões, porém, em que nos sentimos tristes, enfermos, feridos sentimentalmente, caminhando sob nuvens de infortúnios.
Para que o ânimo volte ao nosso espírito, proferimos cheios de fé, fortalecidos de esperança: I A Z U L! Isso passa. Sim, tudo passa.
Virão dias melhores, dias calmos e felizes. A prosperidade e a boa sorte voltarão a iluminar a nossa jornada. A saúde será reconquistada. E a serenidade procurará pouso em nosso coração."

8 de jul. de 2013

Por um acaso

Acaso, criado por Wellington de Oliveira Teixeira, em 08/07/2013
Acaso**, criado em 08/07/2013.

Eu
quando olhos nos olhos
sei quando uma pessoa
está por dentro
ou está por fora

quem está por fora
não segura
um olhar que demora

de dentro do meu centro
este poema me olha
Paulo Leminski (1944 – 1989)


Me permitam apresentar uma questão que me incomodava há muito anos: o chamado acaso e sua relação com Deus.

Negado ou afirmado, sempre com grande ênfase, evitado ou escamoteado com o uso de outras palavras, o acaso me parece tão importante quanto o conceito de necessidade - já que ambos permitem o conceito de evolução.

O acaso é aquele elemento de aleatoriedade infinita - em escala humana - que permite um viés mais simples para equacionar livre arbítrio e vontade divina.

Pois bem, esse modo de encarar o acaso permite sugerir que havendo uma voluntariedade ou desejo produz-se uma atração no campo das possibilidades propiciando encontros que permitem a assimilação de novos elementos.

Assim, para mim, o acaso é um dos maiores presentes de Deus para a humanidade, pois permite que as transformações e aperfeiçoamentos ocorram sem nenhum predeterminismo.

Se nossos encontros acontecem numa intervenção deste acaso, nossos relacionamentos também estão marcados por sua ação, mas sempre a partir de nossa vontade. Ao se entrar em um relacionamento afetivo que ganha prioridade emocional, como na amizade e no amor, as interações tornam-se muito mais poderosas produzindo, a partir das micro transformações no contato, mudanças no indivíduo como um ser. Essas relações são mais prazeirosas e marcantes e, portanto, as mais buscadas.

Essas relações profícuas, as infinitas pequenas assimilações e variações que permitem, os milhões de pequenos aperfeiçoamentos no indivíduo que vão transformando-o (não se esqueçam que tudo iniciou a partir da expressão de sua vontade) produzem o que aprendi a denominar de plenitude como ser - um estado de realização físico-psíquico-espiritual.

Meu entendimento - com base em conceitos filosóficos-cristãos - é de que a vontade de Deus para a humanidade se constituiu, de forma clara, com a identificação dela com Ele na manifestação do amor. Penso isso porque é no amor que, ao objetivar a felicidade de outrem, cedemos parte de nós mesmos. E, um paradoxo humano, esse me parece ser o único caso que ao se dar não se perde nada, ao contrário, a felicidade e a realização torna-se plena: portanto, agindo assim, o ser humano se torna mais identificado com Deus. "E nós conhecemos, e cremos no amor que Deus nos tem. Deus é amor; e quem está em amor está em Deus, e Deus nele" (1 João 4:16-17).

Penso - a partir dos pressupostos de minha fé - que podemos alcançar a vontade de Deus sem nenhuma imposição, por meio desse instrumento maravilhoso que é o acaso. Com ele, é possível crer que, ao manifestar o seu amor a partir da nossa origem, por meio do acaso ele nos dotou dos elementos de aglutinação que permitem refletirmos em nossa existência a sua própria essência: a procura do amor, a incorporação do amor, a manifestação do amor e a transmissão do amor. Quem sabe?, talvez o mais importante ciclo reprodutivo que a humanidade já percebeu ser capaz.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 08 de julho de 2013.

* Era para ser apenas uma anotação no facebook, mas tomou vida própria.

** Acaso (do latim a casu, sem causa) é algo sem motivo ou explicação aparente. Há, pelo menos, três sentidos diferentes, dependendo do sentido dado à palavra causa:
Algo que acontece sem finalidade ou sem objetivo, isto é, algo sem causa final. Oposto, filosoficamente, à teleologia.
Algo que ocorre independente de um determinado precedente, um efeito não predisposto. Oposto, filosoficamente, ao pré-determinismo.
Algo não-explicável por suas (cor)relações (simultânea ou precedente), portanto sem qualquer determinação. Oposto, filosoficamente, ao determinismo.
Definições feitas com base na wikipedia http://pt.wikipedia.org/wiki/Acaso

24 de jun. de 2013

Bolsa Estupro: a anomalia que legitima o estupro e corrói a alma da vítima.

História sem fim, criado por Wellington de Oliveira Teixeira, em 16/06/2013
História sem fim, criado em 16/06/2013.

Há séculos está claro em que lugar nos situamos aproximadamente no reino animal.
Obviamente somos mamíferos, o grupo de animais que se distingue por ter pelos,
nutrir os filhotes e outras características[…]
O meu propósito ao estudar essa situação é ajudar a evitar a repetição dos nossos erros
- usar o conhecimento sobre o passado e as nossas propensões para mudar o nosso comportamento.

Jared Diamond - O terceiro Chipanzé: A evolução e o futuro do ser humano.


Controversa desde a sua formulação, há um certo consenso de que o chamado Estatuto do Nascituro é uma reação a decisões do Supremo (interrupção da gravidez de anencéfalos e às pesquisas com células-tronco de embriões) e à garantia prevista no Código Penal de 1940 (artigo 128, que permite o aborto em caso de violência sexual).

Tema polêmico, principalmente por interferir com avaliações ou entendimentos do que se seja a vida (a caracterização legal de seu início), a proposta que se encontra no Congresso recebe crítica ferozes e apoios acolarados e é entendida de modo diverso por religiosos e não religiosos. O que segue é uma exposição do meu ponto de vista.

O contexto atual

Não importa se são bebês, crianças, adolescentes, adultas ou de terceira idade, segundo a ONU, no mundo, uma em cada cinco mulheres será vítima de estupro ou tentativa de estupro ao longo de sua vida - cerca de 1 bilhão de mulheres. Grande parte delas com consequente gravidez indesejada.

Como ficam, tendo que encarar a criminalização de todas as formas de aborto, inclusive as que são, atualmente, garantidas pela Constituição e outras leis como casos de risco de morte da mãe, de anencéfalos* e em casos de violência sexual?

1) O viés legal

O projeto tem sido classificado como neoconservador por retroceder o mínimo obtido em caso de estupro e risco de vida e por alterar o critério clínico atual para se estabelecer o início-fim da vida com a atividade cerebral, inclusive para os casos de doação de órgãos (morte encefálica). Por esse critério, até a 12ª semana de gravidez, o feto não possui atividade cerebral, não se constituindo (ainda) uma nova vida. A alteração, na prática, irá criminalizar todas as formas de aborto (inclusive em casos de estupro, risco de morte da mãe e anencéfalos).

2) O viés técnico-científico

Ao impedir as pesquisas com células tronco no Brasil vai gerar um grande atraso aos avanços da ciência (medicina, genética, e toda tecnologia), tornando o país dependente (subserviente, importador de remédios e mais atrasado) em relação aos países mais desenvolvidos. As consequências disso, são população mais doente e remédios mais caros e inacessíveis à população de baixa renda, por serem essas pesquisas as mais promissores em termos de tecnologias para curas de diversas doenças de grande impacto.

3) O viés social

É criticado por ser um incentivo a mulheres pobres ter filhos de estupradores (mulheres ricas recorrem a clínicas de luxo ou hospitais para interromper uma gravidez indesejada) ou procurar enfermeiros, parteiras, clínicas clandestinas (morrendo nas mãos dos 'açougueiros') e indiretamente favorecer a própria ação desses criminosos. Também é avaliado como um desrespeito a mulher estuprada e violentada retirando sua autonomia, direito à saúde e dignidade para decidir se quer ou não proceder com uma gravidez indesejada. Em questão de proporcionalidade de benefícios sociais, questiona-se o porque de dentre os milhões de brasileiros nascidos anualmente, cuja maioria encontra-se em situação de risco social (economicamente desfavorecidos), por que somente os frutos de estupro deveriam ser mais protegidos pelo Estado? É considerado um mecanismo bizarro a criação de uma pensão para mulheres vítimas de estupro: priorizando o direito do estuprador, o direito do feto em detrimento do direito da mulher que foi vítima de uma violência.

4) O viés psicológico

Em relação a intimidade da mulher estuprada, o ato hediondo produz, além dos físicos, um sofrimento psíquico que ela carregará para o resto da vida, com todos os traumas decorrentes. A proposta da lei amplia o as suas consequências ao impor um convívio permanente com o sofrimento e os traumas decorrentes do ato do estupro: obrigatoriedade de registrar a criança (concebida por violência ou grave ameaça e não pela vontade dos genitores), em nome do pai estuprador; recebimento de uma pensão alimentícia específica de estupro; direito ao estuprador do exercício, mesmo que distante, da guarda do filho (dependendo da situação, pleitear esta guarda judicialmente).

Assim, as propostas que carregam incentivo financeiro acendem de forma incessante as marcas de uma agressão, constituindo-se uma violência à dignidade humana. Promove uma inversão de valores: tentando defender a vida promove-se morte psicológica da mulher/mãe e da criança/fruto do estupro.

Com relação às possibilidades apresentadas pela proposta da lei, ninguém, em sã consciência, vai acreditar que alguém nascido nessas condições terá os cuidados necessários à saúde psicológica oferecidos por uma pessoa que está em sério grau traumático. E, certamente, colocá-los em centros para menores (local em que ficarão até uma quase que impossível adoção) - confirmadamente fábrica de transgressores e criminosos na realidade brasileira - não fará diferença para melhor.

5) O viés da Paternidade

Estuprador não é pai é um criminoso sem qualquer vínculo afetivo com a vítima, mas ganhará esse status e terá todos os direitos relativos aos verdadeiros pais.

Dar status de paternidade ao estuprador, obriga a uma relação de proximidade com ele para a estuprada e a criança. Isso é uma legitimação da violência sexual.

A tentativa de remedear a vítima com um valor mensal (a chamada bolsa-estupro) só a expõe mais ao fato de não haver relação materno/paterna no contexto. A criação da Bolsa Estupro é uma anomalia em todos os sentidos.

Por tudo isso, eu creio que não é ainda um momento propício para a produção de uma legislação a esse respeito. A sociedade precisa amadurecer a temática. Não é na marra que isso acontecerá. Assim, a classifico como oportunismo político: não visa a criação de uma sociedade consciente ou de medidas socioeducativas e preventivas ao estupro e suas consequências, do modo como está apresentada. A falta de legitimidade dos legisladores atuais - inclusive a da bancada evangélica, sua defensora - não apenas trará insubordinação e o desrespeito à Lei, como ainda promoverá ações do submundo - criminosas como as do tráfico - já que o Estado não dá condições para resolver a questão da gravidez indesejada, fruto de estupro.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 24 de junho de 2013.

*Um recém-nascido com anencefalia geralmente é cego, surdo, inconsciente e incapaz de sentir dor. Alguns nascem com tronco encefálico, mas a falta de um cérebro funcional impossibilita a consciência e ações reflexas. Um resumo básico se encontra em : http://pt.wikipedia.org/wiki/Anencefalia

16 de jun. de 2013

Pense numa história sem fim…

História sem fim, criado Wellington de Oliveira Teixeira, em 16/06/2013
História sem fim, criado em 16/06/2013

Diz a tradição que, no segundo antes de nossa morte, cada um se dá conta da verdadeira razão da existência.
E nesse momento nasce o Inferno ou o Paraíso.
O Inferno é olhar para trás nessa fração de segundo
e saber que desperdiçamos uma oportunidade de dignificar o milagre da vida.
O Paraíso é poder dizer nesse momento:
"Cometi alguns erros, mas não fui covarde. Vivi minha vida e fiz o que devia fazer."
(Aleph - Paulo Coelho)

A coragem de viver: deixo oculto o que precisa ser oculto e precisa irradiar-se em segredo.
Calo-me.
Porque não sei qual é o meu segredo. conta-me o teu, ensina-me sobre o secreto de cada um de nós.
Não é segredo difamante. É apenas isto: segredo.
E não tem fórmulas.
(Água Viva - Clarice Lispector)


É preciso ser criativo, dia após dia, para enfrentar a multidão de acontecimentos que se encara quando há o desejo de estar vivo e não de apenas sobreviver.

Não creia ser esta uma tarefa que alguém possa definir como fácil. Quanto mais experiência temos (nas entrelinhas, mais velhos ficamos) maior o entendimento de que a maleabilidade é uma ferramenta maravilhosa para lidar com as questões que nosso desenvolvimento pessoal propõe, mas como é difícil aprendermos a utilizá-la!

Pode ser uma suposição inexata a que faço, mas, vai precisar de um bom jogo de cintura qualquer um que busque ultrapassar aquelas determinações imbecilizantes e paralisantes que baseiam a vida daqueles que têm medo de tentar, buscar e descobrir motivos e razões antes de, efetivamente, adotar um pensamento ou uma prática.

Tudo bem, a experiência ancestral que nos foi transmitida por meio de costumes e práticas (ou mesmo a genética) tem um impacto grande em nossas construções de valores e com eles os modos de nos conectarmos a determinados grupos sociais e à sociedade como um todo. De forma alguma quero propor um abandono dessa herança.

Desde aqueles pequenos cuidados com a saúde como um chazinho, a canja, a maravilhosa combinação do feijão com arroz brasileira e tantas outras, até a legislação que nos rege o convívio social, foram séculos de aprendizado do tipo prático que só agora recebem atenção das ciências e comprovação oficial.

Mas, e com muito cuidado expresso isso, aquele aprendizado poderia ser outro em outro contexto. E, com os instrumentos que dispomos atualmente, cada um de nós - e não apenas os cientistas - pode fazer suas próprias inferências, descobertas e, especialmente, reavaliações.

Por exemplo, a lógica que possuíamos de enviar mensagens é clássica: papel, caneta ou máquina de datilografar, envelope, selo e Correios, prazo de chegada e prazo de retorno da mensagem. Tudo transformado com o telefone e as mensagens eletrônicas (famosos e-mails, no inglês). É impensável para a nova geração a lógica simples que existia. E com razão: diante de instrumentos novos devem surgir práticas novas.

Por que, então, não somos capazes de nos atualizarmos em tantos outros aspectos? Por que a contextualização não faz parte de nossa vida? Por que aquela velha e querida ranzinza não cede lugar às novidades, às invenções, às transformações?

Tudo bem. E vou concordar completamente com aqueles que pensaram que é preciso avaliar todo e qualquer novo comportamento, o novo em si não é sempre o melhor.

O melhor exemplo que encontro é com relação aos produtos descartáveis e os com obsolescência programada (data de validade). Se antes, um eletrodoméstico durava a vida do seu comprador, isso mudou muito. As lâmpadas duravam séculos, hoje, se muito, um ano. Antes um produto que apresentava defeito era consertado, hoje há o estímulo para comprar o novo e descartar o com problemas.

Certamente essa mentalidade nova nos trouxe questões a serem avaliadas - entre elas, uma bem importante, a dos relacionamentos.

Mas, como tudo que é novo, é necessário um tempo de adaptação, de descoberta da melhor forma de uso e da utilização consciente.

E é aí, que os que desenvolvem em si uma preguiça mental, emocional e até espiritual, se atém ao passado, ao já determinado e o transforma em fixidez, esquecendo que ele foi fruto de mudanças.

Bem, eu comecei pedindo para você pensar em uma história sem fim, não foi? Pois é. Essa é a sua história. E é o seu encontro com a vida e sua participação nas redes de interconexão deste mundo que pode fazer dessa história algo pobre e chato ou algo rico onde cada episódio é capaz de produzir uma imensa vontade de ir adiante e de descortinar os horizontes que trará o capítulo seguinte.

Repito, e dessa vez com uma ternura que poucas vezes possuo, tome a sua vida nas suas mãos com carinho, aceite o desafio de refazer-se diariamente, construa algo novo que fique como uma marca sua para quem vier junto ou depois. Todos precisamos ir ao encontro de nossa própria plenitude como ser. Para alguns que acreditam de uma determinada forma eu diria: um guerreiro que alcança estatura da perfeição.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 16 de junho de 2013.

Sabe aquela vontade que dá de apreciar um bom vinho, saboreando os detalhes de uma boa massa? Não permita a velha e horrível máxima 'vontade é coisa que dá e passa'.

23 de mai. de 2013

Egometria

Egometria, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 23/05/2013
Egometria, criado em 23/05/2013.

Um guerreiro aceita seu destino, seja qual for, e o aceita na mais total humildade.
Aceita com humildade aquilo que ele é, não como fonte de pesar, mas com um desafio vivo.
É preciso tempo para cada um de nós compreender esse ponto e vivê-lo plenamente.
Eu, por exemplo, detestava a simples menção da palavra humildade.
Sou índio e nós índios sempre fomos humildes e nunca fizemos outra coisa senão curvar a cabeça.
Pensei que a humildade não fazia parte da vida de um guerreiro.
Mas estava enganado! Hoje sei que a humildade de um guerreiro não é a humildade de um mendigo.
O guerreiro não curva a cabeça para ninguém, mas ao mesmo tempo não permite que pessoa alguma curve a cabeça para ele.
O mendigo, ao contrário, prostra-se de joelhos por qualquer coisa e lambe as botas de quem quer que ele considere superior;
mas, ao mesmo tempo, exige que alguém que lhe seja inferior lhe lamba as botas.

(Porta para o infinito - Carlos Castaneda)

A questão da superioridade é algo que permeia os conceitos do cotidiano de nossa sociedade. Aprendemos muito cedo na vida que devemos respeitar e aceitar sem questionar as determinações daqueles que estão no comando. Em nenhum momento, a avaliar como surgiu esse comando ou como passaram a ocupar essa posição os seus detentores. Restos de nosso recente passado militar ditatorial. Mas todos sabem que os sujeitos do domínio econômico têm produzido as condições favoráveis para que seus comparsas sejam eleitos e os retribuam com favorecimentos e enriquecimentos.

Nós brasileiros (estrangeiros, também) sabemos que o poder é ocupado - na maioria das vezes - por quem se resigna aos ditames de alguns endinheirados. Sua posição é algo frágil, sustentada por escusas trocas de favores. Então, para que o respeito?

Nossa forma de educar não privilegia as diferenças e o entendimento das consequências dela. Se assim o fosse, diríamos para cada criança, no momento de sua descoberta: veja o quanto você já aprendeu e como é capaz de decidir e agir. Continue assim e conquiste as suas oportunidades para realizar os seus desejos. Não. Não é assim que, nem mesmo aqueles que se dispõem a tal projeto educativo, o fazem.

Não somos ensinados a entender nem a ensinar que a maturidade ou a experiência é um estado possível de ser alcançado e, sim, a querer obter status social.

Vestimos nossas crianças com roupas que as adultizam e achamos normal. Elas precisam parecer e agir como celebridades. Alguém já viu alguém ensinando que ocupar uma posição social é algo que para algumas pessoas é importante - outras desejam outras coisas que também são dignas e valorozas?

Nosso método de valorizar posições é definido pelo conjunto de referências sociais da riqueza: a aparência diz quem se é; esquecemos de valorizar o ser e maximizamos o valor do ter; potencializamos práticas que extinguem a expressão individual, os sonhos pessoais em prol do valor do contracheque; legitimamos o valor absurdo de determinados produtos, nos tornamos painéis ambulantes de algumas marcas; vamos aos lugares onde a comida só prejudica a nossa saúde por que está na televisão e repetimos os jargões preconceituosos das telenovelas.

E os privilegiados, que geram filhos também já privilegiados, são legitimados no poder e todos dizem Amém!

Wellington de Oliveira Teixeira, em 25 de maio de 2013.

As manipulações por parte de alguns políticos de base religiosa sobre incautos é algo que assusta. Sentem-se tão confortáveis com o poder, e nem se preocupam se são, também, apenas um joguete nas mãos dos controladores do mundo, desde que possam tirar um pouco o seu quinhão.
Ah! se Jesus passasse por aqui para expulsá-los do templo (- e quem sabe do Congresso!).

22 de mai. de 2013

Tempo de comemorar (todo dia é!)

Memória, criado por Wellington de Oliveira Teixeira, em 01-05-2013.
Memória, criado em 01-05-2013. (clique para ampliar)


O fato real é quando o corpo entende que pode ver.
Só então ele é capaz de saber que o mundo para o qual olhamos todo dia é apenas uma descrição.

E assim, dançará a sua morte aqui, em cima desse morro, no fim-do-dia.
E, em sua última dança, você contará sua luta, as batalhas que venceu e as que perdeu;
contará suas alegrias e perplexidades ao encontrar o poder pessoal.
Sua dança contará os segredos e maravilhas que você armazenou. E sua morte ficará aqui sentada, assistindo.
O sol poente brilhará sobre você sem queimá-lo, como fez hoje.
O vento será suave e o topo do morro tremerá.
Quando você chegar ao fim de sua dança, olhará para o sol, pois nunca mais o verá, desperto ou sonhando
e, então, sua morte apontará para o sul. Para a vastidão.
(Viagem à Ixtlan - Carlos Castañeda)

Avalio que transformações se estabelecem em nossos relacionamentos, com o passar do tempo. Manutenção também. Por isso, mesmo que não seja a mesma coisa do início - aquilo que chamamos de amor -, algo que se manteve não permitiu que ele fosse descaracterizado.

Em meio às tentativas, os considerados erros e os acertos reprogramam a nossa mente.

A descoberta da capacidade de efetivar algo proporciona segurança, mesmo quando a realidade não garante que obteremos resultados semelhantes na tentativa posterior.

Então, troféus e comemorações são a forma de colocarmos nossa estaca no topo da montanha e nos deslumbrarmos com um novo horizonte - o fruto da nossa vitória.

No entanto, coisas se perdem na viagem e nenhum poder da terra pode fazê-las retornar, ou mesmo recuperá-las do modo que desejaríamos. Ficaram para trás. Marcas daquilo que denominamos morte, as mesmas que vão produzindo, em tudo e a cada momento, milésimos de transformações que possibilitam a sua renovação em outra forma, outro modo ou patamar.

Mesmo não mais acreditando em nossa permanência (mudamos com o passar do tempo), apostamos numa certa imanência que permite que não nos desconheçamos, mesmo quando olhamos para o espelho e ele não reflete mais aquela imagem de tempos atrás. Nossas pequenas e acumuladas descaracterizações, realizadas pela ação da temporalidade, não pode tirar aquilo que em nós se manteve. Isso vale para os relacionamentos mantidos.

Eu considero isso uma conquista que deve ser bem apreciada. Por isso erguerei minha taça para um brinde a essa forma de experiência que inclui as transformações e as manutenções, às pequenas conquistas diárias, mensais, anuais e de vida, porque entendo que todo dia é, sim, tempo de comemorar.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 22 de maio de 2013.


Não sei bem porque, mas esses seis meses, após catorze anos, produziram uma tatuagem no meu coração.

30 de jan. de 2013

Anna Carolina

Anna Carolina 17, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 30/01/2013
Anna Carolina 17, criado em 30/01/2013

Não dê as costas a possíveis futuros antes de ter certeza de que não tem nada a aprender com eles.
Richard Bach


Bem, hoje é o aniversário de Anna Carolina Vieira e eu posso dizer, com certeza, da minha satisfação em vê-la crescer dessa forma linda. Tão linda que torna sua bela aparência apenas um complemento que dá moldura para todas as outras belezas que também possui.

Na busca de palavras para lhe dizer, meu amorzinho, que não fossem contrárias à expressão do seu modo de ser e estar no mundo, escolhi essas: viva todos os momentos que Deus lhe conceder nessa nova idade com graciosidade e com a firmeza de quem busca afirmar a sua plenitude.

Após reler o que havia escrito e pensar que nem sempre o caminho é florido e o sol brilha sem queimar, resolvi acrescentar algumas outras palavras...

E se algum momento for um pouco mais difícil, creia estar encarando um novo e bom desafio: é com eles que nos superamos e ultrapassamos nossos próprios limites.

Mas ainda estava faltando um detalhe: o olhar de todos os que a rodeiam. É verdade que é sempre bom ser agradável com todos, respeitar mesmo quem não conhecemos e ser cuidadoso de modo especial com quem amamos. E, é claro, isso não é simples nem fácil. Depois de refletir mais um pouco, resolvi escrever...

Ser o melhor de si mesmo é um presente de extremo valor que podemos ofertar primeiramente a nós mesmos e depois aos que nos amam de verdade. E, esse modo de ser, certamente, refletirá algo bom para todos.

Bom, aniversário deve marcar mais que uma etapa nas suas conquistas (mesmo aquelas que lhe proporcionam os melhores prazeres que a vida tem para dar), deve expressar com clareza: ultrapassei um limite. E, agora, independente do que venha, eu já estou indo além.

E eu creio que há no mundo apenas uma coisa melhor que se ultrapassar: é saber que foi dando e recebendo amor que se conseguiu.

Agora que eu compliquei tudo, melhor não deixar de falar como todo mundo: Feliz Aniversário!

(E deixo entre parênteses o que diz minha alma: O meu amor, a minha alegria e o meu agradecimento por você ser uma neta tão maravilhosa.)

Grande beijo.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 30 de janeiro de 2013.

10 de jan. de 2013

Germano ou o germinar de uma amizade

Germano Sá-Britto, Capão da Canoa em 31/08/2012
Germano Sá-Britto, Capão da Canoa em 31/08/2012


porque o tempo de uma vida não basta para se viver uma amizade.
Amigos são amigos para sempre.*

Coisas passíveis de transformação, aos poucos podem ir ganhando um status de permanentes e o tempo perde a capacidade de corroer, o caso da amizade.

Vamos, primeiramente, esclarecer um pouco a questão: sonhei que escrevia para ele. Seria algo pleno para mim, até sonhar novamente. Se repetiu-se, é que algo ainda não foi resolvido, adequadamente.

Sei que é um pouco inconveniente isso de se começar dando explicações. É como querer se justificar por fazer algo que se quer. Algumas vezes utilizei esse recurso, talvez pela falta de confiança em mim mesmo. Mas não é esse o caso, agora.

Esse gaúcho, na foto, de sotaque e práticas desconexas é um menino-homem historiador. E, desse modo, construiu a sua história comigo: trocando histórias de vidas.

Ao fim de minha jornada de trabalho, que coincidia com término de suas aulas, ficávamos nas redondezas da UFF matando a fome, a sede, e a vontade de prosear. Pizzas marcaram nossos encontros, assim como, em algumas ocasiões, cervejas. Porém, mais importantes foram as análises de pensamentos, de projetos e de práticas da vida. Essa convivência, por fim, tatuou minha alma de forma indelével.

Ao terminar a sua graduação, questões de busca de melhores oportunidades profissionais que as do Rio, projetaram a sua ida para São Paulo. Claro, precedida de alguns encontros muito interessantes, inclusive pela dificuldade relativa aos ônibus nas madrugadas (apelidados de sereno). Valia a pena.

Dificuldades iniciais marcaram sua chegada ao outro estado. E, durante um longo período, um certo silêncio marcou nosso espaço. Mas os recursos virtuais começaram a proporcionar uma certa reaproximação. E, com isso, outras histórias alcançaram meus olhos e ouvidos e trouxeram um pouco de alegria à minha saudade.

Na vez passada, as coisas estavam mais bem organizadas, seus projetos com mais certezas que dúvidas e me pareceu que suas vivências paulistanas estavam refletindo nos seus atos mais segurança. Como sempre, mais um bom encontro.

Mas o garoto que havia nele tinha uma questão ainda a resolver e precisava de uma participação minha. E, até hoje fico a pensar na escolha que fiz. Talvez, a preocupação de não construir nenhum obstáculo ao nosso espaço ou o medo de uma mudança nos nossos costumes - sei lá o quanto mais pesou na resposta - pode ter criado algum obstáculo para o fluxo contínuo de nossa alma: uma certa falta de coincidência de práticas históricas e atuais comportamentos parece ter retirado um pouco da nossa simultaneidade.

Certamente, não foi um prejuízo que se possa considerar grande, mas parece que algo se transformou.

E, quando tento explicar de uma maneira racional, me digo que estranhei aquele meu guri, por conta de sua transformação em um homem bem resolvido. Mesmo sendo um motivo de felicidade para mim, parece que não ocorreu a sincronia entre aprendizados na alma e na razão. E, por conseguinte, foi preciso algum tempo para que ocorresse a integração entre eles.

Hoje, sei que nossa vivência criou algo que não pode ser apagado ou extinguido. Por isso, aguardo seu retorno para que, juntos, possamos reacender os momentos onde pensamentos e práticas seguiam concomitantes, pois, isso sim, bastaria para deixar 'a mente quieta, [quiçá] a espinha ereta e o coração tranquilo'**.


Wellington de Oliveira Teixeira, em 10 de janeiro de 2013.

* Trecho de Friends, música de Michael W. Smith.

** Trecho de coração tranquilo, incluída em Serra do Luar, ambas de autoria de Walter Franco e interpretadas por Leila Pinheiro.