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28 de jul. de 2015

A nova onda de monstrualização

Onda de monstrualização, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 27-07-2015.
Onda de monstrualização, criado em 27-07-2015.

O relacionamento entre jornais e leitores, internautas, ouvintes ou telespectadores é encarado […] como um tipo especial de história que faz uso de outra, apresentada na forma de unidade noticiosa, com clara função ideológica e persuasiva.
(Nilton Hernandes – A mídia e seus truques: o que o jornal, revista, TV, rádio e internet fazem para captar e manter a atenção do público, p. 39)
hegemonia
O que é: Supremacia, Autoridade soberana.
O que faz: Influência preponderante (liderança, predominância ou superioridade) sobre cidade, povo, país ou pessoas.
Métodos: Aculturação (introdução ostensiva de determinada cultura e visão de mundo) e/ou Militarização.
A Onda (*) é um filme que demonstra a capacidade de monstrualização humana, esse processo de diferenciação negativa do outro, quem quer que seja, por meio de um discurso hegemônico, uma única e inalterável verdade no campo das coisas e das relações pessoais.

Muitos indicam ser apenas fruto de intolerância religiosa. Mas, originariamente, as religiões ocidentais não pregam a destruição alheia e gratuita; dentre as práticas filosófico-religiosas orientais, a questão do equilíbrio me parece ser a tônica. De onde surge, então, tais movimentos? Como as pessoas são cooptadas por eles?

Nas aulas de filosofia conheci o pensador Michel Foucault, que alertava que qualquer acontecimento possui o discurso simultaneamente como um elemento e um dispositivo estratégico de relações de poder. Para ele, a manipulação social não é fortuita, tem alvo específico e há vários níveis de poder operando por meio dela. Pierre Bordieu é um pensador que avaliou a política de percepção cognitiva, a constituição da percepção de mundo por informação e orientação: educar corpo e mente visando obliterar questionamentos e encaminhar para uma determinada direção política.

Em comum, mostravam os processos que constroem os monstros a serem combatidos e a cruzada contra eles. No Brasil atual, ocuparam essa posição os comunistas, os esquerdistas, os gayzistas e quaisquer outros ativistas, especialmente os de Direitos humanos.

Uma vez infiltrados pelos discursos, é recorrente a negação de fatos históricos - até mesmo os recentes — pela multidão. Foca-se na desqualificação como base da estratégia malévola dos discursos de ódio contra qualquer pessoa com um desejo genuíno de uma sociedade mais igualitária e desejosa de políticas de redução das desigualdades sociais. É inadmissível questionar que uma ínfima camada de extremamente ricos gerem uma imensidão de miseráveis.

Criou-se uma Nova Onda. Cooptados inicialmente para a frente do ataque, os religiosos já tinham sido insuflados com o medo de igrejas fechadas e perseguição aos cristãos — pregados nos púlpitos por líderes religiosos inescrupulosos — desde a época da campanha visando colocar Collor na presidência da República.

A construção de simulacros — por meio de artigos e editoriais de revistas e do jornalismo televisivo— criou os salvadores da pátria, os paladinos da justiça, os incorruptíveis. Estes mesmos, comprovadamente corruptos, foram alvo do endeusamento manipulativo dessas publicações. Se em período eleitoral praticamente todas as matérias de capa da revista Veja eram exemplos, agora a questão é ininterrupta. Quem ganha e quem perde com isso?

De uma coisa tenho certeza:
  • os dóceis-manipuláveis cordeiros estão indo para o matadouro sorrindo, mesmo agindo absolutamente de forma contrária ao que professavam anteriormente;
  • Os politicamente-agora-inativos, desistiram da busca por justiça social porque desiludidos com a realidade que sempre souberam existir: o ser humano é altamente corruptível;
  • As camadas mais alienadas da sociedade, minorias e miseráveis, se deparam com a mais férrea onda antagonista que já tiveram conhecimento.
Culpabilizados, injuriados, agredidos e assassinados, quem se opõe à nova onda é alvo da mais nova monstrualização, da manipulação perpetrada pelo poder financeiro, político e midiático que quer recuperar sua hegemonia, fragilizada nesses últimos anos.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 28 de julho de 2015.

* A Onda, dirigido por Dennis Gansel, é um filme alemão de 2008 que teve como inspiração o livro de mesmo nome de Todd Strasser e o experimento social da Terceira Onda.
Num curso sobre autocracia de apenas uma semana, o professor encara uma turma composta por alunos da terceira geração após a Segunda Guerra Mundial. Diante da incredulidade destes num ressurgimento da ditadura na Alemanha moderna, é iniciado um experimento que demonstra a facilidade da manipulação das massas.
Inicialmente, os alunos passaram a chamar o professor de Senhor Wenger e ficaram dispostos em carteiras para duas pessoas de frente para ele e ocupadas por estudante com baixa e outro com alta média escolar: deverão aprender com o outro, tornando-se um só. Qualquer fala deverá ser feita em pé e em frases curtas. Uma marcha em perfeita sincronia rítmica visa produzir a sensação de unicidade e incomodar a turma de anarquismo, no andar abaixo.
Por sugestão do professor, o grupo uniformiza as roupas (camisa branca e calças jeans) evitando distinções. Uma aluna reluta a adotá-lo, afirmando que uniformes acabam com a individualidade; outra comparece no dia seguinte sem uma camisa branca e percebe ser a única a não aderir ao uniforme.
Por sugestão dos próprios alunos, o grupo ganha o nome A Onda, uma forma de saudação (braço direito em frente ao peito), e um símbolo que, em forma de adesivos e pichações, alcança toda a cidade, inclusive a fachada da prefeitura.
As alterações nos comportamentos tornam-se visíveis. Um valentão protege o colega de alguns anarquistas brigões. As festas tornam-se exclusivas para membros d'A Onda, onde não-iniciados são hostilizados. Um dos alunos que era um excluído anteriormente adota completamente a ideia, queima suas roupas de marca e se oferece para ser guarda-costas do professor, que o convida para jantar. Sua esposa, professora na mesma escola, questiona o experimento por ter ido longe demais mas ele a acusa de inveja do seu sucesso com os alunos, gerando a separação do casal.
Surge uma oposição à Onda, irritando seus membros, que buscam um modo de eliminá-la. Num jogo de polo aquático, um dos membros d'A Onda briga com um oponente e a partida é cancelada. Ao mesmo tempo, inicia-se uma briga entre os torcedores. Na confusão, panfletos anti-Onda são distribuídos no meio das torcidas.
Em outra discussão, o causador da briga esportiva agride a namorada. Percebendo o que fez, vai a casa do professor e pede que ele acabe com A Onda. Este convoca uma assembléia com o grupo no auditório da escola.
A portas trancadas ele discursa, exaltando as atuações do grupo e as chances do movimento mudar os rumos da Alemanha. Ao receber um protesto, acusa de traição quem o fez e indicando uma punição. A seguir leva os alunos a perceber o quanto estavam sendo manipulados, mesmo crendo inicialmente que um regime como o Nazismo jamais teria lugar novamente, no país.
Ao declarar o fim d'A Onda, o aluno que desejava ser segurança do professor saca um revólver por medo de se isolar novamente. Alguém, crendo haver nela balas de festim, tenta retirar-lhe a arma e é ferido. Descontrolado, percebendo o erro que cometeu e o fim dA Onda, se suicida perante os estudantes traumatizados. O professor é preso, diante dos alunos, pais e outros professores.

A semiótica é uma teoria do texto que busca analisar os sentidos e a construção dos efeitos de sentido. Neste texto, as referências usadas para avaliar o percurso persuasivo de construção de sentidos e os 'efeitos de sentido' foram:
Pierre BOURDIEU: Meditações Pascalianas, de 2001.
Michel FOUCAULT: 1) Estratégia, poder-saber, de 2006; 2) Vigiar e punir: história da violência nas prisões, de 1987.
Antonio GRAMSCI usa a palavra hegemonia para descrever o tipo de dominação ideológica de uma classe social sobre outra, destacando a da burguesia sobre o proletariado e outras classes de trabalhadores. Para Todd Gitlin, a noção de cultura de Gramsci chama atenção para as estruturas rotineiras do 'senso comum', que funciona como sustentáculo para dominação de classe e tirania.

2 comentários:

Anônimo disse...

Carisma: a arte da sedução. A frase é clichê, parece título de filme pornô, mas nem por isso deixa de guardar verdades. Max Weber escreveu sobre liderança carismática. Em vez de uma mera qualidade pessoal (de um astro pop, de um político ou de um “cara maneiro” qualquer), o líder carismático precisa possuir algo missionário, quase religioso. Seus seguidores buscam objetivos espirituais de redenção e salvação. “O desejo de ser liderado por uma personalidade forte durante uma crise, o anseio para que nossa existência tenha algum propósito, o quase louvor por ‘heróis’ e ‘celebridades’, o desejo ardente pela salvação e redenção”. “Seres humanos são animais sociais. Queremos fazer parte de algo. De outro modo, a vida seria uma experiência muito fria. E somente compreendendo como os que buscam o poder tentam nos influenciar, e como é comum participarmos ativamente de nossa própria manipulação, podemos finalmente perceber o perigo com o qual nos deparamos, quando abandonamos a racionalidade e o ceticismo, depositando nossa fé em um líder com carisma.” (O carisma de Adolf Hitler: o homem que conduziu milhões ao abismo / Laurence Rees. Rio de Janeiro: LeYa, 2013.)

Anônimo disse...

Eis o link para o livro citado: http://lelivros.site/book/download-o-carisma-de-adolf-hitler-o-homem-que-conduziu-milhoes-ao-abismo-laurence-rees-em-epub-mobi-e-pdf/