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18 de jul. de 2014

Fragmentos recuperáveis

Fragmentos recuperáveis, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 16-07-2014.
Fragmentos recuperáveis, em 16-07-2014.

Da Vinci sempre fora um tema embaraçoso para os historiadores, especialmente na tradição cristã. Apesar do seu gênio visionário, era um homossexual assumido e um adorador da divina ordem da Natureza, dois "crimes" que o colocavam em perpétuo estado de pecado contra Deus. Além disso, as bizarras excentricidades do artista projetavam uma aura admissivelmente demoníaca: da Vinci exumava cadáveres para estudar a anatomia humana, mantinha misteriosos diários em uma ilegível escrita invertida, acreditava possuir o poder alquímico de transformar o chumbo em ouro, julgava-se até capaz de enganar Deus criando um elixir que adiava a morte, e as suas invenções incluíam horríveis e nunca antes imaginados instrumentos de guerra e de tortura.
A incompreensão gera a desconfiança, refletiu Langdom.
(Dan Brown - Código Da Vinci - edição especial ilustrada, p.52)

Há quem reclame de tédio, mas quer apenas novidades mais ou menos — do tipo que não altera o status quo padrão: ir para novos restaurantes e casas de show, nova tendência da roupa (agora a calça tá mais apertada e colorida!); a gíria, cantor ou banda da moda.

Os retornos constantes de tudo que marcou época, mesmo com pequenas modificações, são a marca da falta de construções realmente novas. Mas, quem as quer realmente?

Sendo franco, acredito que, no fundo, poucos gostam das alterações radicais das rotinas, do desconhecido, do que exige um esforço para se concretizar. O incerto carrega, potencialmente, o medo em sua composição, daí a resistência. Mas, se houver vontade de avaliar, creio que se perceberá que, para contornar a questão, a cultura dominante promove sempre a aproximação com alguma antiga radicalidade que foi apropriada pelo sistema, como o foram as culturas limítrofes do skate, do surf, do rock. Os novos, controlados e lucrativos esportes radicais.

Não é difícil você encontrar expressões com a expressão inglesa new — como foi com o new hippie — para caracterizar o controle. O que era uma marca registrada de um modo de ser aventureiro, o velho jeans amaciado no corpo, surrado com o uso até tornar-se puído, tornou-se uma calça novinha, produzida com as mesmas características - com um preço justo, por isso, é claro: sua pressa foi atendida.

Em um mundo orientado para produtos ou orientado para clientes e não pessoas, o new você já virou padrão: renove-se! A questão que se apresenta é que a proposta não propõe a existência de nenhuma mudança real, são apenas enfeites e penduricalhos no velho manequim — que continua o mesmo de sempre.

Não gostamos do medo, mas deveríamos, mesmo sendo ele paradoxal: se a sobrevivência é impossível sem ele, a impotência se sustenta nele. E você fica entre um extremo e outro, deslizando em função dos acontecimentos e das emoções.

A ousadia na vida é algo tão sui generis que as pessoas já adotaram a expressão isso não é pra mim, quando confrontadas ou incentivadas a tentar.

Então, e essa é a proposta dessa reflexão, não se preocupe, ouse um pouco mais, deixe cair alguns pedaços. Um dia você reabsorverá grande parte dos fragmentos que ficaram dispersos pela vida — repletos de histórias e emoções que o contagiarão de revivências. Os outros, os que não importam de verdade, é melhor que realmente não voltem.

Mas haverá, certamente, haverá uma questão a que você será confrontado: reconstruir, renovar ou construir algo novo?

Wellington de Oliveira Teixeira, em 18 de julho de 2014.

* O código Da Vinci, como livro ou filme, permite aventura e descobertas. Mais ainda, pensar em inventividade: o mundo do explorador de possibilidades, Leonardo, é uma mostra do espírito humano em sua incansável busca por transformação, aperfeiçoamento e expressividade. Todos os códigos apresentados na obra são fragmentos que precisam ser questionados, avaliados e aglutinados para criar um painel completo. Crítica à perda de reverência pelo sagrado, afloram mais que às instituições religiosas ou práticas perversas individuais. Encantadoramente subversivo.

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