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11 de ago. de 2015

Culpa, medo e fuga

Culpa, medo e fuga, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 10-08-2015.
Culpa, medo e fuga*, criado em 10-08-2015.

É preciso entender a diferença entre responsabilidade e culpa.
Culpa é o sentimento originado da ideia de que as coisas têm que acontecer como a pessoa quer.
Responsabilidade é assumir que você é responsável por suas atitudes.
(Paulo Sérgio Guedes — psicanalista e psiquiatra, autor de Sentimento de Culpa)

Não conheço ninguém que diz nunca ter tentado escapar — de todas as maneiras imagináveis, inclusive transferindo a responsabilidade do fato para outra pessoa — quando ficou completamente exposto por algo feito que não correspondia ao esperado ou socialmente aceitável. E, caso alguém me dissesse o contrário, bem… creio que não acreditaria assim de cara, especialmente quando já me permiti olhar para as crianças ao redor, na hora de alguma encrenca.

Provavelmente, você está no lado dos que afirmam que o medo e a fuga estão constantemente na ordem do dia do ser humano e, talvez, já tenha se questionado sobre o que nos leva a atuar dessa maneira. Evidente que há a tradicional resposta religiosa: somos pecadores, etc. Sendo sincero, esse tipo de resposta — mesmo se verdadeira — não pode bastar. Por isso, a psicologia busca esclarecer quais mecanismos nos levam a agir assim; quais são as propensões internas, os motivadores externos e as experiências pessoais que constroem tal comportamento.

Dizem que o primeiro homem já agiu de tal forma e que herdamos seu DNA da culpa e do medo das consequências. Na alegoria, fugiu da responsabilidade de ter comido algo proibido culpando a mulher; esta culpou à serpente que — mesmo sendo possível dividir a responsabilidade, não o fez — a assumiu. Não adiantou muito, todos foram penalizados.

Analisando o mito, a culpa, o medo e a fuga originam-se em uma sobredeterminação, uma ordem que nos impede de reagir ao necessário ou ao desejo. Lembre-se que desejo pertence à esfera do que ocupa a mente, não apenas a do que se pode ver. Sabem disso todos os que já se imaginaram em situações distintas do possível, inclusive as proibidas.

No entanto, há pessoas que escapam desse mecanismo. Agem sem culpa, para o bem ou para o mal. Alguns muito poucos, não conectados aos controles sociorreligiosos, fazem uma vida baseada na ética. Porém, os presos aos descontroles — incluindo alguns sociopatas e assassinos em série —, sem culpa alguma, atuam de forma antiética, antissocial ou desumana.

No cotidiano, há casos mais simples, como os das pessoas que não se importam em usar de falsidades para autopromoção ou a promoção de uma ideia que as beneficiarão — mentiras, propagandas e postagens falsas nas redes sociais viralizam. Há os que o fazem por dinheiro, entendendo ser apenas um trabalho o enganar outras pessoas. E são bem recompensados por isso. Aliás, dentro do capitalismo selvagem, há sempre vagas sobrando para pessoas assim. Na política, nem se fala, é prerrequisito.

Vivenciamos um período onde o contrassenso assume feições incríveis: níveis de hipocrisia máximos dão status e enriquecem. Quem questiona ou age de forma contrária é desprezado. Não terem mais ética ou não mais se sensibilizarem é lamentável. O pior é haver espaço na sociedade para tal e isso ser reforçado positivamente — especialmente por quem prega o contrário.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 11 de agosto de 2015.

* O que é sentido como sentimento ou introspectivamente observado como estado da mente são estados do corpo, que são produtos de certas contingências de reforçamento. As contingências podem ser muito mais facilmente identificadas e analisadas do que sentimentos e estados da mente e, ao voltar-se para elas como coisas a serem mudadas, a terapia comportamental aufere uma vantagem especial.
Esta é a posição behaviorista: volte aos eventos ambientais precedentes para explicar o que alguém faz e, ao mesmo tempo, o que essa pessoa sente enquanto faz alguma coisa. Para cada estado sentido e designado pelo nome de um sentimento, presumivelmente existe um evento ambiental anterior do qual esse estado é produto. A terapia comportamental se interessa mais pelo evento antecedente do que pelo sentimento.
Os estados corporais resultantes da ameaça da punição são nomeados de acordo com sua fonte […]. Quando a punição advém […] do governo fala-se em culpa […]. Um modo de fugir é confessar e sofrer a punição, mas quando não é claro o comportamento sobre o qual uma punição atrasada foi contingente, a fuga pode ser difícil. Contingências aversivas meramente acidentais geram inexplicáveis sentimentos de vergonha, culpa ou pecado; e, então, as pessoas tendem a procurar um terapeuta em busca de ajuda para fugir deles.

(Burrhus Frederic Skinner — Can Psychology be a science of mind? p.101-109).

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