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2 de ago. de 2014

Hélices de vidro

Hélices de vidro, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 02-08-2014.
Hélices de vidro, criado em 02-08-2014.
Assim como talvez não haja, dizem os médicos, ninguém completamente são,
também se poderia dizer, conhecendo bem o homem, que nem um só existe que esteja isento de desespero,
que não tenha lá no fundo uma inquietação, uma perturbação, uma desarmonia,
um receio de não se sabe o quê de desconhecido ou que ele nem ousa conhecer,
receio duma eventualidade exterior ou receio de si próprio;
tal como os médicos dizem de uma doença, o homem traz em estado latente uma enfermidade,
da qual, num relâmpago, raramente um medo inexplicável lhe revela a presença interna.

(Søren Aabye Kierkgaard - O Desespero Humano, em Os Pensadores, p.329 *)

Cortantes e praticamente invisíveis, palavras são como hélices, de vidro:
refletem, somente em lampejos, a intenção dos que geram, a custa da paz,
a propulsão para alçar seus vôos mesquinhos.

(Wellington de Oliveira Teixeira)
São muitos os caminhos que percorremos em função de conquistar uma vida plena. Aquela que acreditamos será a que nos trará a paz, a tranquilidade. Talvez, a plenitude.

Nos inventamos. Em cada dia, pedacinhos não de vitórias mas de avanços iludem nossas percepções e nos carregam para um outro adiante, uma outra meta, ou apenas um seguir.

Nos tornamos. E, de quando em vez, paramos. O fluxo interrompe. Um espaço fica não preenchido e com ele — o vazio que se instaurou — as inquietações, as dúvidas.

Nos esvaziamos. São silêncios que não sinalizam pausa, descanso, quietude de alma. São momentos não classificáveis. Não são tristezas por algo, não são dores por perdas, não é sentimento de nulidade.

Nos caçamos. É como um eco distante. Um sinal das profundezas da alma. Algo amorfo que apenas transparece, reluz por infinitesimal instante, fazendo com que algo seja disparado, aceso, ligado. Fugidio estalo que se propaga mente e corpo e produz uma angústia pelo infinito, inalcançável entendimento de tudo, uma expressão plena e total de si.

Nos encontramos. Nessas brechas atemporais que se produzem apesar do cotidiano, involuntariamente, é onde detectamos a fonte máxima de cada um. A pura vontade em potencial. Aquilo que intuímos como potência de vida. Nosso único lar, em si: Ser.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 02 de agosto de 2014.

* Minha vida não será, apesar de tudo, mais do que uma existência poética. Segundo György Lukács (1885-1970), o dinamarquês Kierkegaard (1813-1855) revela em sua declaração heroísmo, honestidade e tragédia. Heroísmo, em ter desejado criar formas a partir da vida; probidade, em ter seguido até o fim o caminho escolhido; tragédia, em ter desejado viver aquilo que jamais poderia ser vivido.
Para Régis Jolivet o pensamento de Kierkegaard formou-se, não tanto por assimilação de elementos estranhos, mas sobretudo através de uma luta de consciência, cada vez mais intensa e cada vez mais exigente, perante as condições, não já da existência em geral, mas do seu próprio existir. Sua filosofia é precisamente ele mesmo, não fortuitamente e, de certo modo contrariado, mas ele mesmo voluntária e sistematicamente, a tal ponto que o existir como indivíduo e a consciência desse existir chegaram, a ser, para ele, condição absoluta da filosofia e até sua única razão de ser.

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