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17 de ago. de 2014

Vício intrínseco

Vício intrínseco, criado por Wellington de Oliveira Teixeira, em 17-08-2014.
Vício intrínseco, criado em 17-08-2014.

Ela é uma droga pesada que te arranca de casa e, ao mesmo tempo, é o motivo de voltar pra casa.
Ela é lunática e perfeita, essa é pra casar; daquelas que mata o noivo no altar, se atrasar.
Te arremessa na cama e te poe no divã; é o veneno mortal no seu café da manhã;
é o amor matinal e a roubada de brisa. Até sua foto 3x4 é arte Mona Lisa.
Mano, avisa lá que hoje eu não vou jogar
porque ela acaba de ligar dizendo que tá muito louca pra que eu fique muito louco, também,
esperando ela voltar pra me fazer de refém.
Isso parece crime, mas eu não quero abrir ocorrência, senão eu sofro de abstinência:
ela combina carinho e dependência com poesia e inocência. Essa mina vicia.
(Rashid - Vício)


É como a gravidade, de que não se escapa. A gente foge, se dirige para a direção oposta. Desvia o pensamento e tenta preencher os vazios que repentinamente se impõem.

É inviável tentar se policiar o tempo todo. Um pequeno vacilo, uma brecha: lá se vai o controle e o pensamento vai em busca do desejo interditado, guardado, ocultado por tanto tempo, até da própria consciência.

É a vontade de comer ou qualquer outra forma de prazer, que se achega e nos seduz e nos reduz de forma inescapável ao que nos constitui.

Avaliando por moral, o imoral é temporal e isso para quem não é ingênuo é algo de que é difícil não resvalar sempre.

Queria que cada um se permitisse o que merece, inclusive um pequeno jantar acompanhado de um bom vinho. Pequenos, deliciosos e desejáveis prazeres.

Fugir do enrijecer: não dá para ser o que quer que seja em tempo integral, aceite! Somos parciais e desejamos as diferentes formas de nos satisfazer: todo excesso enjoa e destrói o encanto. Até mesmo um talento, uma profissão ou uma paixão.

Encenamos um espetáculo de encontros e desencontros e, na medida do possível, tentamos dar um toque de infinitude nos sentimentos que nos tomam e até nos encantam, como esta enevoada mas enluarada noite que convida para voos nos recônditos da alma. Que pede um surpreendimento dos covardes e escravizadores padrões como se gritasse 'É preciso ultrapassar(-se)'.

E enquanto a cortina do novo dia não ilumina o rosto, aprontando com o sonolento despertar e afugentando os resquícios dos pequenos, pulsantes, mas resguardados indícios dos verdadeiros sonhos, a gente fica de olhos fechados. Faz de conta que dorme. Disfarça que a vida tropeçou e quase xingou e engoliu em seco para seguir em frente. Não se diz que, lá no cantinho, se permitiu sentir a dor que tumultuou a alma. Respira-se fundo, tenta-se preencher qualquer espaço raso ou profundo, se preparando para abrir as cortinas e, de novo, saudar o respeitável público.

E lava-se o rosto, para espantar o que não pode ocupar o dia, e enfrenta-se as realidades produzidas ou admitidas como se fossem ansiadas. É como um vício intrínseco. Mesmo esfacelando-o em milhões de pequenos e inofensivos pedaços, não se pode garantir a impossibilidade de que a sua regeneração instantânea ocorra em um determinado segundo onde a trama do destino nos coloque no palco dos acasos ou dos encontros. A inevitável negação de si talvez seja a única possibilidade para quem dirige a peça. E para todos que a assistem.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 17 de agosto de 2014.

* O termo originado do latim intrinsecus - interno, inerente, constitutivo - pode qualificar algo na parte interior de outra coisa e que é fundamental para a sua existência. O âmago, íntimo e profundo.
É o que se estabelece fora de qualquer convenção:
  • o valor intrínseco de uma moeda é o seu valor conforme o peso do metal precioso à cotação comercial.
  • anatomicamente, o que se origina e incide no local em que age: o músculo.
  • na Física, o que decorre de maneira igualitária; o semicondutor ideal sem quaisquer influências e/ou impurezas.

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