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29 de jul. de 2017

Meio-termos e Refazimentos

Refazimentos, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 27-07-2017.
Refazimentos, criado em 27-07-2017.

O bem, para o homem, é o exercício ativo de faculdades de sua alma
em conformidade com a excelência ou a virtude…
Além disso, essa atividade deve estender-se por toda a vida;
pois uma andorinha só não faz verão,
nem o faz um único dia de sol.

(Aristóteles, c.350 a.C.)


O problema com as 'pessoas de bem' é exatamente desejar impor suas verdades para escamotear as próprias insidiosidades. O tal Bem, ao invés de uma virtude*, tornou-se nada mais que uma farsa, sempre reconstruída e reafirmada, para aglutinar seres incapazes de assumir seus ódios, preconceitos e intolerâncias; àqueles incapazes de encarar a si mesmos sem suas máscaras sociais.

É fácil perceber que não basta, para mudar um comportamento ou práticas sociais, ver o sofrimento que causa, inclusive em quem se diz amar. Desconstruir preconceitos leva um tempo surpreendentemente maior que o que se imagina ao provar suas falhas e demonstrar suas inconsistências.

Mesmo quem percebe os erros, se agarra às tradições, ou está tão imbuído delas que seu domínio sobre a própria individualidade é pior do que o jugo sobre alguém aferrado e em calabouço.

Práticas enraizadas e destituidoras da humanidade (esta que deveria ser respeitada em cada um) não existem apenas em locais culturalmente destituídos. São efetivadas, com a obscena tolerância da maioria, por letrados, por magistrados, por todos os que, orgulhosamente, ocupam o posto de capitães do mato.

Domínio sempre foi a motivação dessas práticas e o motivo de não serem desfeitas em prol de novas, mais includentes. Cada vez que surge uma renovação nas formas de relacionamento – e deveriam soar como uma chance de aprimoramento ou o desfazimento do abuso das anteriores – são eficientemente cortadas pela raiz por discursos inflamados, rogando o direito às tradições, quando não pelas vias diretas e físicas da agressão.

Quando encaramos a manutenção do poder do status quo social, essa vontade de submeter outrem, fica escancarado o quanto ela esgarça os principais traços de virtudes naqueles que desenfreadamente o buscam.

Qualquer prática que, de forma impositiva, aliene o outro de suas potências pessoais é vil. É necessário e urgente empreender a sua revisão. Isso vale para as alienações e exclusões, tanto quanto para o impedimento de formas de ser diferenciadas.

É preciso bater na mesma tecla, impiedosa e constantemente, até esclarecer e desobstruir as mentalidades constituídas com inverdades, com pontos de vistas exclusivistas, que visam egoisticamente criar segregação e manter a casta que sobrevive do constrangimento alheio: todos, absolutamente todos, merecem ter a sua humanidade, sua forma de ser, respeitada.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 29 de julho de 2017.

* O meio-termo (reproduzido de Ética da Virtude, Ben Dupré, p.102)
O meio-termo é importantíssimo na concepção de virtude de Aristóteles. Às vezes, essa doutrina é erroneamente vista como um apelo à moderação, no sentido de seguir o caminho do meio em todos os assuntos, mas a coisa não é bem assim. Como a citação deixa claro, o meio-termo deve ser definido tendo estritamente a razão como referência.
Um exemplo: a virtude que reside no meio-termo entre a covardia e a precipitação é a coragem. Ser corajoso é não apenas uma questão de evitar ações covardes como fugir do inimigo; ela também é necessária para evitar ações impulsivas e tolas, como iniciar um ataque fútil que resultará em prejuízo próprio e prejudicará os camaradas. A coragem depende da razão governando os instintos básicos e não racionais de uma pessoa; o ponto crucial é que a ação deveria ser apropriada às circunstâncias, conforme determinado pela sabedoria prática que responde com sensibilidade aos fatos específicos da situação.
A virtude, então, é um estado de caráter concernente à escolha, reside no meio-termo que é definido tendo-se a razão como referência. É um meio-termo entre dois vícios, um de excesso e outro de deficiência; e, de novo, é um meio-termo porque os vícios respectivamente excedem ou ficam aquém do que é correto tanto nas ações quanto nas paixões, ao passo que a virtude encontra e escolhe o que é intermediário. (Aristóteles, c.350 a.C.)

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