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12 de mar. de 2016

Hieróglifos a serem decifrados

Hieróglifos, criado por Wellington de Oliveira Teixeira em 12-03-2016.
Hieróglifos*, criado em 12-03-2016.

Não existe aprendiz que não seja “egiptólogo” de alguma coisa. Alguém só se torna marceneiro tornando-se sensível aos signos da madeira, e médico tornando-se sensível aos signos da doença. A vocação é sempre uma predestinação com relação a signos. Tudo que nos ensina alguma coisa emite signos, todo ato de aprender é uma interpretação de signos ou de hieróglifos.
(Gilles Deleuze — Proust e os signos, 1987, p.4)


Obliterar a razão passou a ser encarado como opção — o ditado afirma que a ignorância é uma benção. Há segredos que é melhor não conhecê-los; o que os olhos não veem, o coração não sente; certo?

O cérebro trabalha com muito mais dados que remete à razão, a cada momento. Capta, mas não destaca nem descarta. Com exageros, o acúmulo de informações pode atrapalhar e complicar demais, até as escolhas simples. Há momentos em que simplificar é a chave. Há outros em que ignorá-lo pode ser fatal.

Muitos se aprisionam no dualismo do preto ou branco (bem ou mal, verdadeiro ou falso, certo ou errado), mesmo tendo ciência de que há uma escala imensa de tons de cinza intermediando-os e infinitas intensidades de sombra entre a luz e a escuridão.

Este raciocínio é válido para a compreensão de mundo: os níveis de clareza reestruturam o cenário e sobredeterminam as percepções, dando-lhes novos significados. Simplificando, você interpreta diferentemente a mesma situação.

Como a trama de um suspense aonde os detalhes são apresentados aos poucos, reorientando as suspeitas e redirecionando a culpa a outra personagem. Muitas das vezes, o culpado constrói falsas pistas para impedir a investigação, implicar outro, de tal modo que o investigador ingênuo acha que foi fácil identificar e prender o culpado.

É em meio a uma cortina de fumaça que ganham destaque os bons avaliadores, os detetives capazes de perceber as armadilhas colocadas para os ingênuos caírem. Eles são os capazes de perceber um submundo por trás da aparências, do que é mostrado ou ocultado.

Quando encaram as situações como desafio, como hieróglifos a serem decifrados, buscam ampliar o espectro de sua visão e do entendimento até expandir sua análise. Para tanto, a partir do preto no branco, vão alcançando e invadindo a sua vizinhança ou periferia e contextualizando os supostos fatos.

Em um momento ou noutro — e isso é inevitável — os pontos limítrofes surgem espontaneamente (sorte) ou são alcançados decisivamente (método). Em determinado ponto, a abrangência possível dentro desse processo se esgota, é verdade. Mas, antes que isso ocorra, a visão ingênua foi desfeita e, com ela, o colarinho e amarras do inequivocamente parcial e inexato, o engano e a manipulação.

É sempre indicado, primeiro, esgotar os recursos pessoais ou de colaboradores. Assim, alcançando ou não o entendimento completo do contexto, é possível decidir-se por um caminho ou outro. E esta sempre será a única escolha que pode ser considerada verdadeira, pois é a única que é construída dando o melhor de si mesmo.

Wellington de Oliveira Teixeira, em 13 de março de 2016.

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hieróglifo
Cada um dos sinais da escrita de antigas civilizações como a dos egípcios, dos hititas e dos maias. Considerados símbolos sagrados, só eram acessíveis à elite: sacerdotes, realeza e o alto comando. Foram por muito tempo algo indecifrável. O trabalho árduo do linguista francês Jean-François Champollion permitiu a decifração dos hieróglifos egípcios.
Para elementos emaranhados, não identificados corretamente, qualquer interpretação é válida. Uma vez alcançado o código base de cada signo ou sinal, a sua interpretação passa a ser muito mais acurada. Essa é a diferença entre o processo científico de avaliação da realidade e o do senso comum, sujeito a qualquer forma de indução à interpretação.

Um comentário:

Anônimo disse...

Pedra da Roseta: volição (Dom Juam), ou vontade de potência (Nietzsche).